|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
DANUZA LEÃO
Fome zero com dez filhos?
Ninguém pode negar que,
apesar de meio confuso, o
governo Lula está cheio de boas
intenções.
Se esforçou para que o Brasil
entendesse que o Fome Zero não é
apenas um programa assistencial
para dar comida a quem tem fome - até porque este problema
vai se apresentar três vezes por
dia até o fim do mundo -, mas
que, aprendendo, até os mais pobres vão poder viver melhor. Demorou, mas o Brasil entendeu.
O projeto é ambicioso: passa pela educação, pelo primeiro emprego, pela saúde, pela reforma
agrária etc., e vários ministérios e
secretarias foram criados para
que o futuro dos brasileiros carentes seja menos miserável.
Tudo muito louvável.
Mas quem viu nos jornais e na
televisão os habitantes de Guaribas morando em casebres com
chão de terra batida, sem esgoto e
sem água, e as pobres vítimas das
enchentes tendo que deixar seus
barracos desmoronados, pode ver
que eles têm algo mais em comum, além da miséria: uma
grande quantidade de filhos.
Com tantas reuniões, tantos programas, tão bons propósitos, ficou
faltando ao novo governo falar do
controle da natalidade.
Em cada família são 6, 8 ou 10
crianças, e quanto mais pobres
elas são, mais filhos têm. Matar a
fome, educar e arranjar um primeiro emprego para cada um deles já vai ser difícil. Inclusão social? Pode ser, mas para daqui a
quantos anos? 50? Aí eles terão se
multiplicado a tal ponto que vai
ser ainda pior - ou impossível.
Nunca ninguém explicou a
uma mulher de Guaribas que é
possível decidir quantos filhos ela
quer ter: 10 ou nenhum. Ela não
sabe, e também nunca ouviu falar
que com menos filhos poderá ter
uma qualidade de vida melhor e
até trabalhar para ajudar a alimentar a família.
Um programa desses teria ser
feito em duas etapas: na primeira,
mais educativa, alguém - os tais
agentes - para dizer que existem
opções, deixando claro que a escolha final é dela. Esse seria um
programa trabalhoso, a ser implantado cuidadosamente. Vai
demorar, botar na cabeça dessas
mulheres que elas têm esse direito, talvez o primeiro da vida delas.
Na segunda fase - se ela estiver
interessada - um agente do posto de saúde do município explicaria os vários procedimentos possíveis e forneceria os meios para
que as mais pobres e menos esclarecidas tenham tanto direito a fazer seu planejamento quanto as
outras, que têm informação e os
meios suficientes para comprar a
pílula ou usar um diu. As escolhas
são muitas e variadas, e que fique
bem claro: ninguém está falando
em laqueadura geral.
Os países mais pobres não podem ter a ilusão de resolver seus
problemas correndo o risco de ver
sua população dobrada ou triplicada em alguns anos.
E comida para toda essa gente?
E trabalho? Não dá para não pensar: sem o controle da natalidade
ninguém vai dar jeito no país.
Primeiro, as mulheres têm que
saber; depois, elas decidem o que
querem, e de que jeito.
Não vai existir cidadania enquanto a panela estiver vazia e
um punhado de crianças descalças, analfabetas e sub alimentadas passarem o dia sentadas no
chão de terra, sem nenhuma perspectiva de futuro.
E-mail - danuza.leao@uol.com.br
Texto Anterior: Lei também reserva vagas para deficientes físicos Próximo Texto: Grande SP tem sol e pancadas de chuva à tarde Índice
|