São Paulo, quinta-feira, 09 de março de 2000


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PÂNICO
Ontem, só 10 famílias continuavam na Sem Terra; traficantes forçaram retirada
Favela de SP vira cidade fantasma

SORAYA AGÉGE
da Reportagem Local

São Paulo passou a ter ontem sua primeira favela fantasma. As dez últimas famílias da favela Sem Terra, na Vila Prudente (zona sudeste) pretendiam deixar o local ontem à noite. Em duas semanas, cerca de 390 barracos da Sem Terra e da vizinha favela Paraguai foram abandonados, a mando dos chefes do tráfico de drogas local.
Gangues que disputam o tráfico no complexo de favelas existente na região, que vai de Vila Prudente a Heliópolis, estabeleceram o dia de ontem como último prazo para o êxodo dos moradores. A polícia manteve até helicópteros no local, mas as famílias cumpriram a ordem de desocupação, anunciada há duas semanas.

Fome ou morte
"A gente prefere a fome que a morte", disse Izilda (nome fictício), que cansou de procurar outra moradia em São Paulo e tentava voltar com a família para o sertão baiano. O medo é justificado: ela presenciou dois assassinatos na favela.
Há dois meses, Izilda pagou R$ 700 por um barraco na Sem Terra. Naquela época, as duas favelas tinham a proteção de um traficante conhecido como Barriga (leia texto nesta página). Com o desaparecimento do chefe do tráfico local, o grupo de Heliópolis passou a impor regras aos moradores da Sem Terra.
Nas duas últimas semanas, a cena de famílias retirando suas mudanças ou mesmo abandonando seus barracos foi comum.
"Cansamos de chamar a polícia, mas ninguém veio nos socorrer. Um dia depois da chacina (dia 29 de fevereiro), ateamos fogo em pneus na pista para obrigar os policiais a virem", disse Marisa (nome fictício).
O 21º BPM (Batalhão de Polícia Militar), que atende à região, nega a falta de policiamento.
Muitas das famílias conseguiram outros barracos para viver, em favelas distantes da região. Algumas foram morar sob viadutos e pontes.
Até o início da tarde de ontem, dez famílias ainda permaneciam na Sem Terra e outras 50 na Paraguai. Na maioria das vielas, só ficaram marcas de tiros e manchas de sangue.
Nos barracos, os sinais da fuga apavorada. Pacotes de arroz, roupas e até berços foram deixados para trás. Em uma porta, o último apelo: "Favor não invadir este barraco".


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