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São Paulo, sexta-feira, 09 de maio de 2003

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RETRATO DO BRASIL

Segundo IBGE, sem-documentos, que voltaram a crescer, não têm acesso a programas governamentais

No país, 29,4% dos bebês não têm registro

MARTA SALOMON
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Voltou a crescer o número de brasileiros sem registro de nascimento -uma das mais graves marcas da exclusão social no país. Pesquisa do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) mostra que quase uma a cada três crianças nascidas em 2001 não recebeu certidão no primeiro ano de vida. O chamado sub-registro ultrapassou a marca de 1 milhão de crianças no ano mais recente da série do IBGE.
O percentual -29,4%- supera o registrado em 1997, quando foi aprovada lei garantindo certidão gratuita aos "reconhecidamente pobres". Na época, o governo promoveu campanhas para estimular o registro ainda nos hospitais e, sobretudo, para tentar vencer a resistência dos cartórios às certidões gratuitas. Alguns cartórios chegavam a cobrar meio salário mínimo pelo documento.
Espanta o aumento dos casos desde 99, quando o sub-registro ficou em 21,5% dos nascidos vivos no ano ou cerca de 727 mil bebês, ainda de acordo com o IBGE.
A situação dos sem-documento é mais grave no Norte e Nordeste, mas também há casos nas regiões metropolitanas das grandes cidades da região Sudeste do país.
Sem o registro civil, o brasileiro é um cidadão pela metade: não pode matricular-se na escola nem ser atendido na rede hospitalar. Mais tarde, o sem-certidão também fica impedido de tirar identidade ou carteira profissional.
A falta de documentos também deixa parte das famílias pobres do país excluída dos programas de transferência de renda do governo. O cadastro único de pobres, administrado pela Caixa Econômica Federal, rejeita o registro de quem não tem documento.
Em 64,5% dos municípios brasileiros, esse foi o motivo apontado para o atraso no cadastramento dos pobres, famílias com renda de até R$ 90 por pessoa.
O cadastro alcançou cerca de 65% das 9,3 milhões (número estimado) de famílias que estariam aptas a receber o benefício.
O resultado é que os mais pobres ficariam à margem dos programas dirigidos a eles, segundo avaliação do secretário de Direitos Humanos, Nilmário Miranda.

"Suprema exclusão"
"Muitos ainda nascem sem registro e morrem sem atestado de óbito, ou seja, não existem oficialmente, nenhuma política social os atinge, com exceção de alguma cesta básica em época de eleição: é a suprema exclusão social", observa o secretário. Miranda tem no registro civil uma das prioridades de sua pasta.
Em Guaribas, cidade-piloto do Fome Zero, 14 dos 500 chefes de famílias selecionados não tinham registro. Na mesma cidade do Piauí, Maria Mendes Alves ficou "clandestina" até os 60 anos.
O crescimento do chamado sub-registro por dois anos seguidos contraria uma tradição que indica o aumento do volume de certidões emitidas em anos de eleição no país, avalia o demógrafo do IBGE Antônio Tadeu de Oliveira. Desde 1998, também vem caindo o ritmo do registro tardio, aquele que é realizado depois dos dez anos de idade. Essa queda é outro indicador ruim.
A situação dos adultos sem documentos é mais complicada porque, depois dos 12 anos de idade, o registro depende de uma autorização da Justiça.
Mas não se sabe ainda qual é o total de "clandestinos". Isso dependeria de uma pergunta específica no Censo ou na próxima contagem de população.
As estatísticas de hoje comparam uma estimativa de crescimento da população (número de nascimentos) com os dados de registros repassados pelos cartórios.


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