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RETRATO DO BRASIL
Segundo IBGE, sem-documentos, que voltaram a crescer, não têm acesso a programas governamentais
No país, 29,4% dos bebês não têm registro
MARTA SALOMON
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Voltou a crescer o número de
brasileiros sem registro de nascimento -uma das mais graves
marcas da exclusão social no país.
Pesquisa do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística)
mostra que quase uma a cada três
crianças nascidas em 2001 não recebeu certidão no primeiro ano
de vida. O chamado sub-registro
ultrapassou a marca de 1 milhão
de crianças no ano mais recente
da série do IBGE.
O percentual -29,4%- supera
o registrado em 1997, quando foi
aprovada lei garantindo certidão
gratuita aos "reconhecidamente
pobres". Na época, o governo
promoveu campanhas para estimular o registro ainda nos hospitais e, sobretudo, para tentar vencer a resistência dos cartórios às
certidões gratuitas. Alguns cartórios chegavam a cobrar meio salário mínimo pelo documento.
Espanta o aumento dos casos
desde 99, quando o sub-registro
ficou em 21,5% dos nascidos vivos
no ano ou cerca de 727 mil bebês,
ainda de acordo com o IBGE.
A situação dos sem-documento
é mais grave no Norte e Nordeste,
mas também há casos nas regiões
metropolitanas das grandes cidades da região Sudeste do país.
Sem o registro civil, o brasileiro
é um cidadão pela metade: não
pode matricular-se na escola nem
ser atendido na rede hospitalar.
Mais tarde, o sem-certidão também fica impedido de tirar identidade ou carteira profissional.
A falta de documentos também
deixa parte das famílias pobres do
país excluída dos programas de
transferência de renda do governo. O cadastro único de pobres,
administrado pela Caixa Econômica Federal, rejeita o registro de
quem não tem documento.
Em 64,5% dos municípios brasileiros, esse foi o motivo apontado para o atraso no cadastramento dos pobres, famílias com renda
de até R$ 90 por pessoa.
O cadastro alcançou cerca de
65% das 9,3 milhões (número estimado) de famílias que estariam
aptas a receber o benefício.
O resultado é que os mais pobres ficariam à margem dos programas dirigidos a eles, segundo
avaliação do secretário de Direitos Humanos, Nilmário Miranda.
"Suprema exclusão"
"Muitos ainda nascem sem registro e morrem sem atestado de
óbito, ou seja, não existem oficialmente, nenhuma política social os
atinge, com exceção de alguma
cesta básica em época de eleição: é
a suprema exclusão social", observa o secretário. Miranda tem
no registro civil uma das prioridades de sua pasta.
Em Guaribas, cidade-piloto do
Fome Zero, 14 dos 500 chefes de
famílias selecionados não tinham
registro. Na mesma cidade do
Piauí, Maria Mendes Alves ficou
"clandestina" até os 60 anos.
O crescimento do chamado
sub-registro por dois anos seguidos contraria uma tradição que
indica o aumento do volume de
certidões emitidas em anos de
eleição no país, avalia o demógrafo do IBGE Antônio Tadeu de Oliveira. Desde 1998, também vem
caindo o ritmo do registro tardio,
aquele que é realizado depois dos
dez anos de idade. Essa queda é
outro indicador ruim.
A situação dos adultos sem documentos é mais complicada porque, depois dos 12 anos de idade,
o registro depende de uma autorização da Justiça.
Mas não se sabe ainda qual é o
total de "clandestinos". Isso dependeria de uma pergunta específica no Censo ou na próxima contagem de população.
As estatísticas de hoje comparam uma estimativa de crescimento da população (número de nascimentos) com os dados de registros repassados pelos cartórios.
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