São Paulo, domingo, 09 de maio de 2004

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EXCLUSÃO

Alcance das ações de transferência de renda chega à metade do prometido pelo governo; até dezembro, índice pode ir a 67%

Marta cumpre 54% de sua meta social

SÍLVIA CORRÊA
DA REPORTAGEM LOCAL

Os programas de transferência de renda criados pela administração de Marta Suplicy (PT) beneficiaram -até agora- metade da população que a Prefeitura de São Paulo disse que atenderia. Em dezembro, no final do mandato, o governo terá chegado, no máximo, a dois terços da meta.
Em números absolutos isso significa que, desde junho de 2001, quando os pagamentos começaram, 316.801 pessoas receberam pelo menos uma vez o dinheiro dos programas Renda Mínima, Bolsa Trabalho, Começar de Novo e Operação Trabalho.
Há dois anos, no entanto, antes das eleições para o governo do Estado, a administração municipal anunciou que as bolsas beneficiariam, até o final de 2004, 589.057 famílias cujos chefes tinham renda inferior a um salário mínimo e meio. Na prática, não aconteceu.
Agora, na melhor das hipóteses, a ação chegará a 67% dessa meta. Para tanto, o governo tem de pagar os benefícios a cerca de 80 mil pessoas em 40 dos 96 distritos da cidade. A Secretaria do Desenvolvimento, Trabalho e Solidariedade diz que isso acontecerá até junho -a quatro meses da eleição.
No comando dos programas sociais, o economista Marcio Pochmann, 41, secretário de Trabalho, prefere avaliar o desempenho das ações por outro ângulo: o da abrangência geográfica. "Tínhamos o compromisso de chegar a toda a cidade e vamos chegar. Não há cota: fez o cadastro e atende às exigências, pagamos."
O cadastramento, no entanto, foi aberto uma única vez em cada distrito -em 50 deles, em 2001. De lá para cá, o desemprego atingiu mais 250 mil pessoas na cidade, mas quem perdeu a renda depois que as inscrições terminaram não teve uma segunda chance.
Pior: o cadastro único fez com que simples erros de endereço, por exemplo, tenham sido suficientes para excluir potenciais beneficiados -muitos dos quais aguardam a bolsa até hoje.
Com o cobertor curto, a opção pela expansão geográfica -que garantirá ao PT o direito de dizer que levou os programas a toda a cidade- excluiu a possibilidade de a prefeitura voltar aos bairros e buscar esses carentes sumidos.
"Não ignoro o problema, mas há limitação orçamentária, e escolhas têm inegavelmente de ser feitas", diz Pochmann.
Alheia aos vizinhos excluídos, dona Ana Maria, do Jardim Iguatemi (zona leste), está satisfeita. Aos 32 anos e dois filhos, ela sorri contando que, com os R$ 70 mensais do Renda Mínima, sustenta as crianças e o marido e já comprou uma cama. "É pouco, mas já não preciso pedir. Tem mês que dá até para algumas bolachas."
Em histórias e números, o cenário dos programas sociais é de contradições. São os maiores do país, mas mal chegam aos excluídos da cidade. Injetam, a cada mês, R$ 13 milhões em famílias pobres -o suficiente para construir 12 escolões ao ano. Mas, se todas tivessem recebido ajuda ininterrupta, a média mensal de repasse por beneficiado ficaria em R$ 50 -pouco para uma cidade na qual 311.318 chefes de família não tinham renda em 2000 e onde consumir as 2.280 calorias diárias sugeridas pela Organização Mundial da Saúde custa R$ 80 ao mês.
A falta de impacto social é o principal obstáculo no caminho das políticas públicas. "No Brasil, as ações não visam o pobre. Quando visam, não o atingem. Quando o atingem, não melhoram a vida dele", resume Marcelo Neri, 41, pesquisador da Fundação Getúlio Vargas (FGV-RJ).


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