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Promotoria investiga projeto que reduz trânsito de bairros
Programa autoriza bairros residenciais a estreitar as ruas para inibir tráfego
Ministério Público Estadual de São Paulo diz que o projeto privilegia áreas ricas e não resolve problema semelhante na periferia
KLEBER TOMAZ
RICARDO SANGIOVANNI
DA REPORTAGEM LOCAL
O Ministério Público Estadual investiga supostas irregularidades em um programa da
Prefeitura de São Paulo que autoriza bairros residenciais a estreitar ruas para inibir o tráfego
de veículos em locais usados
como rotas de fuga por motoristas para escapar do congestionamento das vias principais.
Desenvolvido pela CET
(Companhia de Engenharia de
Tráfego) desde o início da atual
gestão, em 2005, o Programa
Comunidade Protegida é uma
versão do "traffic calming"
(moderação de tráfego), disseminado em países europeus,
onde são implementadas ações
para conter o avanço de carros
em áreas predominantemente
residenciais.
Na versão paulistana, os bairros que obtêm aprovação da
CET para implantar o programa podem estreitar as pistas
das ruas com o alargamento das
calçadas e instalar pisos intertravados, rotatórias, faixas de
pedestres elevadas, refúgios e
sinalizações no asfalto.
O programa piloto foi implementado em dezembro, na rua
Pedralva, no Alto de Pinheiros,
bairro nobre da capital, onde
foram criados alargamentos
nas calçadas, uma rotatória
com floreira na entrada da rua e
piso diferenciado para chamar
a atenção dos motoristas. A
idéia da CET é expandir o programa para 16 bairros -apenas
três deles da periferia.
Inquérito
De acordo com a Promotoria
de Justiça de Habitação e Urbanismo, um inquérito civil apura
se a CET praticou improbidade
administrativa ao executar o
programa. O promotor José
Carlos de Freitas diz que o projeto privilegia ricos ao promover a "formação de feudos em
bairros nobres".
E aponta mais falhas: informa que o projeto possui indícios de ilegalidade porque a
CET não realizou audiência pública para a implantação dele
nos bairros e que os moradores
das áreas vizinhas nem sequer
foram consultados. Outro problema, diz Freitas, será o aumento de congestionamentos
em vias principais, pela dificuldade de o motorista usar rotas
de fuga por conta do programa.
O promotor argumenta que o
programa é elitista porque, dos
16 bairros previstos para recebê-lo, 13 estão em áreas de alto
padrão. Os outros três são da
periferia da zona leste. São Mateus, Vila Carmosina e Cidade
Tiradentes foram escolhidos
pela CET, mas ainda não foram
contemplados porque, quando
a própria comunidade não arca
com os custos, as obras dependem de recursos federais.
Em depoimento prestado em
4 de outubro de 2007 ao Ministério Público, o engenheiro Irineu Gnecco Filho, superintendente de desenvolvimento da
CET, afirmou que os três bairros "aguardam a liberação [de
uma verba federal] de cerca de
R$ 14 milhões" para dar início
ao programa. Para o promotor,
a demora significa a falta de recursos que inviabiliza o projeto
em áreas pobres.
O promotor também questiona a pouca publicidade do
programa nas áreas pobres.
"Não sabíamos de nada, nunca
fomos consultados. Não conhecia o programa [até ser procurado pela reportagem]", disse o
coordenador do Centro de Associações e Sociedades Populares da Cidade Tiradentes, Dorival Gomes. "Há três meses pedimos rebaixamento de guias
para facilitar o acesso de cadeirantes e uma rotatória. Ainda
não fomos atendidos."
Para efeito comparativo, o
City Boaçava, bairro nobre na
zona oeste, irá gastar R$ 350
mil para implantar o Programa
Comunidade Protegida. As
obras, que modificarão um perímetro de 11 km de vias, começaram na semana passada. O
dinheiro foi obtido com moradores dos 520 imóveis da área.
Os casarões e mansões do lugar
são avaliados entre
R$ 800 mil e R$ 2 milhões.
Maria Augusta Cabral de Oliveira, secretária da SAB (Sociedade Amigos do Bairro City
Boaçava), diz que o programa
foi uma "idéia oferecida há três
anos pelo [presidente da CET]
Roberto Scaringella. Nos organizamos e conseguimos anuência de 70% dos moradores [mínimo para a implementação do
projeto]. É uma região com
área verde, qualidade de vida,
que não pode ter trânsito intenso. Vai melhorar muito."
"A idéia é boa porque vai ajudar a evitar assaltos [dois por
semana, em média, em maio,
segundo a associação de moradores]", diz o comerciante Fábio Carvalho, 42, morador do
bairro. Já o administrador Jorge Sampaio, 67, que trafega pelo City Boaçava, argumenta que
"bloquear as ruas agride o direito do morador de outras regiões que passa por ali, em prol
de uma minoria privilegiada."
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