São Paulo, quinta-feira, 09 de agosto de 2007

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Ex-ministro da Justiça reprova recompensa

José Carlos Dias, especialista na área penal, diz que ficará "muito mal para o Brasil" se a PF aceitar US$ 5 mi dos EUA

"Se eles [a polícia] têm dois deveres para cumprir, vão optar por aquele dever que tem uma recompensa", afirma o advogado

LUISA ALCANTARA E SILVA
DA REDAÇÃO

O advogado José Carlos Dias, 68, ministro da Justiça durante o governo FHC, critica a possibilidade de a Polícia Federal receber a recompensa de US$ 5 milhões (cerca de R$ 9,5 milhões) do DEA (Drug Enforcement Administration, a agência americana contra drogas) por ter prendido o traficante Juan Carlos Ramírez Abadía.
"Acho que é aético e imoral", disse ele, que é especialista em direito penal. Leia a entrevista:

 

FOLHA - O que o senhor acha da possibilidade de a PF receber a recompensa por ter prendido Abadía?
JOSÉ CARLOS DIAS -
Eu digo o seguinte: é absolutamente... É de uma legalidade duvidosa. Eu acho que é aético e imoral.

FOLHA - Por quê?
DIAS -
Porque a Polícia Federal existe como instituição para combater o crime. Ela não tem que receber prêmio de um país estrangeiro porque ela cumpre o dever dela. Eu acho que isso fica muito mal para o Brasil e fica muito mal para a Polícia Federal. Ainda que [o prêmio] não seja individualmente para alguém, ainda que se dissesse, "bom, isso vai para um determinado fim, para uma instituição", alguma coisa assim, mas não importa. Eu tenho a impressão de que a Polícia Federal não pode. Não pode receber prêmio pelo cumprimento do dever.

FOLHA - Existe alguma lei que proíba o recebimento?
DIAS -
Eu desconheço se tem alguma coisa proibindo, mas, sob o ponto de vista ético, eu acho que é absolutamente reprovável.

FOLHA - Por qual motivo?
DIAS -
É o dever dela [prender o traficante]. Pagar para a polícia porque cumpre o dever é desestimular o cumprimento gratuito do dever. Então, se eles têm dois deveres para cumprir, vão optar por aquele dever que tem uma recompensa.

FOLHA - E se, em vez de a recompensa ser para a Polícia Federal, fosse para um funcionário dela?
DIAS -
Isso aí então... Aí nem se fala. É muito pior. Muito pior.

FOLHA - O que deve ser feito?
DIAS -
Acho que o governo brasileiro deve dizer: "Não, a PF cumpriu o dever dela".


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