São Paulo, domingo, 09 de agosto de 2009

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Americano defende liberação de drogas

Diretor-executivo da Aliança de Políticas para as Drogas diz que Brasil pode liderar uma mudança para legalização do consumo

Segundo Ethan Nadelmann, nunca existirá sociedade livre das drogas, com exceção dos esquimós, porque nada podem cultivar


ANDRÉA MICHAEL
DA SUCURSAL DO RIO

Ao estrear um ciclo de palestras no Brasil, o especialista norte-americano Ethan Nadelmann, diretor-executivo da organização Aliança de Políticas para as Drogas, disse no Rio de Janeiro que o Brasil tem as melhores credenciais, entre os países da América Latina, para liderar uma mudança cultural que levará à legalização do consumo de drogas.
"Nunca existirá uma sociedade livre das drogas, com exceção dos esquimós, porque nada podem cultivar. Portanto, essa é uma discussão que tem que ser feita", disse Nadelmann, na sede do movimento Viva Rio.
Nadelmann acha que o Brasil está bem situado em relação à maioria dos países no cenário internacional no tema em discussão. Mas já esteve "mais otimista em relação ao governo Lula". Por quê? Viu como sinal negativo a nomeação, para a Senad (Secretaria Nacional Antidrogas), de um militar (general Paulo Roberto Uchôa). "Poderia ter sido, por exemplo, alguém da área de saúde pública", afirmou.
A leitura sobre ter um militar em tal posto é que o país está mais alinhado com uma estratégia de "guerra" contra as drogas, uma linha hoje muito criticada e em revisão em todo o mundo, no âmbito da ONU e também nos Estados Unidos.
Em um retrospecto histórico, Nadelmann lembrou que o fundamental, neste debate, não é sobre se as drogas fazem mal. "O que importa é quem consome." Traduzindo a visão norte-americana, resumiu: se pretos, pobres e imigrantes consumiam, era ilegal.
"Se o Viagra não tivesse sido feito pelo indústria farmacêutica e não fosse consumido pelos homens brancos poderosos, mas fosse feito por químicos ilegais e consumido por jovens negros, seria ilegal".
Nadelmann encerrou na semana passada uma palestra no Rio com a apresentação de uma pesquisa, encomendada pelo Ministério da Justiça, em que as pesquisadoras Ela Wiecko (UnB) e Luciana Boiteux (UFRJ) apresentaram a análise de 730 sentenças condenatórias em crimes de tráfico de drogas entre os anos de 2006 e 2008.
Conforme a Folha revelou, a principal conclusão é que a maioria dos réus é primário, foi preso sozinho e não pertencia ao comando das organizações do tráfico. Resumo: prende-se o varejo, mas o atacado continua no crime.
Experiente interlocutor do governo norte-americano, país no qual 15 dos 50 Estados aceitam o uso terapêutico da maconha, Nadelmann também abordou a importância de estratégias de marketing para tratar do assunto.
Algumas das estratégias apresentadas por ele foram:
1) Falar com os pais dos adolescentes, que querem a todo custo proteger seus filhos.
2) Não usar a palavra legalizar, pois, em tese, transmite a ideia de descontrole.
3) Sinalizar que a melhor forma de combater o tráfico é competir com ele, de maneira legal, mantendo sob o acompanhamento de regras o comércio das drogas, da mesma forma que acontece com o álcool e com o tabaco -mas sem os apelos da propaganda.
"Nossos países foram os últimos a abolir a escravidão, vamos trabalhar para que sejam os primeiros acabar com a proibição", com a ressalva, no entanto, de que essa deverá se necessariamente uma decisão mundial.


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