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Para viciado em droga, descobrir o traficante de crack é impossível
DA REPORTAGEM LOCAL
Nove da manhã é a hora do
"blocão" (pedra grande), explica César, 36, "nóia" assumido.
Apesar do desatino geral na calçada da rua Helvétia, em Campos Elíseos (região central), onde mais de cem usuários de
crack estão sentados, César parece tranquilo. "Acabei de dar
uma paulada, mas você não diz.
Dificilmente me altero."
Ele conta que o blocão logo é
dividido em muitos pedaços e
repassado.
"Às vezes eu mesmo chego
com a pedra grande, que eu
consegui por R$ 10; divido em
18 "biricos", vendo cada um por
R$ 2 e já tenho o dinheiro de
mais três pedras", calcula.
Como se a cadeia até o traficante fosse um labirinto interminável, e indecifrável, ele diz
que no crack é impossível descobrir o traficante. "Ninguém
sabe quem é, exatamente, o cara. As coisas vão chegando."
Cerveja no bar
Viciado há dois anos, César
diz que experimentou o crack
com um primo e que não sentiu
a sensação forte que muitos dizem levar ao vício imediato. "A
gente voltou a fumar na mesma
semana, mas como quem toma
uma cerveja no bar", lembra
ele, que tem um filho de 12
anos, a quem não vê há um ano.
Desempregado, ele diz que é
"motorista autônomo".
Apesar da balbúrdia na calçada da Helvétia, César diz que as
biqueiras (pontos de "nóias")
seguem uma disciplina estipulada à distância pela facção criminosa PCC (Primeiro Comando da Capital). Segundo ele,
agressões físicas e roubo (entre
eles) não são tolerados. "Os caras vão ter de conversar com
um grandão."
A etiqueta do "nóia" manda
que, à passagem de mulheres
com crianças no colo, diga-se:
"Olha o ar do anjo", para que todos recolham seus cachimbos.
Cesar passou quatro meses
num Centro de Detenção Provisória, por "pequenos delitos".
"Sou contra roubar na rua. Pego só de quem tem muito", diz.
Para participar da chamada
"ciranda dos nóia", ou o trânsito do "vapor" (o que repassa),
não é preciso estar em alguma
biqueira. A reportagem perguntou a um rapaz que caminhava na rua Vieira de Carvalho, bem longe do centro da
cracolândia, se ele tinha visto
usuários por ali. Foi o suficiente para que o jovem se pendurasse na janela do carro e oferecesse uma pedra. "Fala aí, mano, vai querer quanto?"
(PS)
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