São Paulo, domingo, 09 de setembro de 2001

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Associação de docentes vê processo de "privatização"

DA REPORTAGEM LOCAL

Ciro Teixeira Correia, presidente da Adusp (Associação dos Docentes da USP) e professor do Instituto de Geociências, diz ser contra a proposta de regulamentação das fundações que o Conselho Universitário quis votar no último dia 4.
Para ele, ao contrário de aumentar o controle público sobre as entidades, o texto concentra no reitor o poder de decidir sobre a ação delas dentro da USP.
Correia vê na proposta de regulamentação "a continuidade do processo de privatização" do ensino público superior.
Leia a seguir os principais trechos de entrevista concedida à Folha:

DISCUSSÃO - Hoje há uma série de fundações que têm desenvolvido atividades dentro da universidade se valendo da infra-estrutura e do corpo docente sem que a USP tenha discutido se isso é adequado ou não. Nós entendemos que essas questões não estão devidamente discutidas.

REGULAMENTAÇÃO - Fomos contrários à votação de uma nova minuta [adiada na última terça-feira para a próxima gestão" porque há uma resolução em vigor que tenta normatizar [as fundações", e a proposta que estava em pauta, no nosso entendimento, ao contrário de aumentar o controle da universidade, concentra na mão do reitor o poder de decidir quando a universidade deve aceitar uma entidade como fundação de apoio.
A minuta [da regulamentação" propõe um cadastro das fundações, e as que estiverem no cadastro poderão desenvolver projetos e administrar cursos. Para estar no cadastro, dependem de ato do reitor, ouvidas comissões do conselho. Ela atribui o poder exclusivamente à figura do reitor. Isso é inadequado. Estamos diminuindo o controle.

PROFESSORES - Eventualmente existem professores que estejam se beneficiando de complementação salarial, por exemplo. Não tenho números sobre isso.
Esses dados não são apresentados pela USP. É responsabilidade da universidade dizer quantos docentes estão trabalhando nas fundações, qual o regime de trabalho desses docentes, quanto eles recebem.
Mas a questão é como a sociedade vê isso. Será que uma universidade pública deve colocar parte do corpo docente e da infra-estrutura a serviço de interesses vinculados a fundações privadas?

PRIVATIZAÇÃO - A eventual aprovação da minuta, para mim, é a continuidade de uma privatização da universidade.
A Constituição brasileira estabelece que o ensino nas instituições públicas superiores deve ser gratuito. E, para contornar isso, têm-se criado cursos de extensão universitária, pós-graduação lato sensu, cursos vinculados às fundações que são pagos. Isso é prejudicial para a universidade, para a sociedade e para os estudantes.
Esse tipo de ação cria uma privatização, porque pega uma parte da capacidade intelectual, através do corpo docente, e da infra-estrutura operacional da universidade, que, por definição, deve ser destinada a toda a sociedade.
O acesso deve ser garantido de forma equânime a todos, e você começa a destinar parte do sistema a uma parcela da sociedade que tem poder para pagar por ele.

RECURSOS - Há uma linha de argumentação aqui [na USP" que diz que a instituição universitária não consegue hoje viver sem as fundações. Isso não se sustenta.
Embora o volume de recursos que passe pelas fundações seja grande, a parcela que é revertida para a universidade é pequena.
O orçamento da USP é de R$ 1,1 bilhão. O dinheiro das fundações que é repassado significa 1,5% disso. A universidade não depende disso.



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