São Paulo, domingo, 09 de setembro de 2001

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Trabalhadores condenam opção por crime

GABRIELA ATHIAS
DA REPORTAGEM LOCAL

O gari Luiz Carlos Almeida, 39, sai de casa todos os dias às 4h30 para trabalhar. Uma hora e meia de trem e ônibus (lotados) separam sua casa, em Mauá, na periferia da Grande São Paulo, da praça da Sé, seu ponto de varrição. No fim do mês, ele leva para casa R$ 280 "limpos". Para ele, o sofrimento que Fernando Dutra Pinto impôs à família do empresário Silvio Santos "não tem perdão".
"Se todo pobre sair matando e sequestrando os outros por ai, já pensou o que vai ser do Brasil"? pergunta o pedreiro desempregado José Miguel da Silva Filho, 47, morador da Vila Matilde (zona leste), periferia de São Paulo.
Nos dias 5 e 6, a Folha ouviu 13 trabalhadores de nove regiões diferentes da capital e da Grande São Paulo. A maioria das entrevistas foi feita depois que a namorada de Fernando, Luciana dos Santos Souza, a Jenifer, disse diante das câmeras de TV que o dinheiro do sequestro seria destinado à compra de cestas básicas.
"Ah, moça, coração dos outros é terra que ninguém vai. Mas eu arrisco dizer que essa Jenifer está mentindo", disse o desempregado José da Silva, 43, que faz bico para estúdios de fotografia 3x4 em frente ao Poupatempo da praça Alfredo Issa, no centro.
Dos 13 entrevistados, 12 condenaram a atitude de Fernando Dutra Pinto. Todos o consideraram "ousado", mas ninguém disse que o sequestrador é inteligente.
"Se ele fosse inteligente, não teria sido preso nem o dinheiro devolvido", diz o ajudante de padeiro Luiz José da Silva, 45.
Outros, como o gari Daniel Franco da Silva, 34, disseram que "quem é inteligente não comete crime, arruma trabalho".
Os entrevistados, especialmente os desempregados, não aprovam a idéia da vida marginal dos bandidos que os impede de "entrar e sair dos lugares de cabeça erguida" e faz com que eles "tragam vergonha" para a família.
"A pessoa que comete um crime perde a dignidade", diz o faxineiro José Mineiro da Silva, 48.
"A gente se lasca por aí, mas mantém a cabeça erguida", disse seu José da fotografia, aquele que passa oito horas por dia em pé em frente ao Poupatempo tentando atrair clientes para os estúdios.


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