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São Paulo, domingo, 09 de novembro de 2003

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URBANISMO

Barracos de madeira invadem conjuntos habitacionais; prédios ainda abrigam bares improvisados e até igrejas

Moradores erguem favela em Cingapura

DO "AGORA"

O Cingapura, projeto de habitação popular lançado em 93 pela Prefeitura de São Paulo, foi feito para substituir favelas por prédios. Mas, ao invés de os 39 conjuntos de edifícios substituírem as favelas, hoje são elas que ameaçam tomar conta desses locais.
Em dois conjuntos -os Cingapura São João e Chácara Bela Vista, na Vila Maria (zona norte da capital)- visitados na semana passada pela reportagem, famílias sem-teto ergueram barracos entre os blocos de prédios.
Na base do improviso, três, quatro e até nove pessoas se espremem em "casas" de um cômodo só e cerca de 20 m2 de área.
"Isso aqui foi abandonado. A prefeitura construiu às pressas e depois nunca mais se preocupou", diz Cícero Pinheiro do Nascimento, 31, líder comunitário do Cingapura São João.
Os barracos, surgidos nos últimos quatro anos, ganharam até valor comercial. Com um amigo, a família de Edna Alves, 43, comprou um deles, de dois cômodos, no Cingapura Chácara Bela Vista. Cada parte pagou R$ 250.
A dona-de-casa Francisca Maria da Silva, 23, trocou Campinas por São Paulo há dois anos. Uma amiga, moradora do Cingapura São João, lhe cedeu uma garagem -feita de madeira-, onde ela passou a viver com o marido e dois filhos. Outras famílias resolveram copiar a idéia.
Há seis meses, um acordo permitiu que os ocupantes das garagens desmanchassem as "casas" e usassem a madeira para construir barracos em outra área, também dentro do Cingapura.
No Cingapura Chácara Bela Vista, o desempregado Manoel Martins Bezerra, 38, não vive em uma garagem, mas em um carro.
A deterioração dos prédios do Cingapura não começou com os sem-teto. Antes chegaram os comerciantes -em geral, moradores das próprias unidades- que improvisaram instalações, a maioria de madeira, para vender todo o tipo de produto.
Nos dois conjuntos, os estabelecimentos mais comuns são bares. O de Gidálcio Santos, 38, lota aos finais de semana, quando ele serve caldo de mocotó e promove bingos. "Os prêmios são de R$ 20, R$ 30." As paredes são cheias de fotos de mulheres seminuas. Entre elas, alguns homens de cuecas. "Preciso contentar a mulherada, também", explica Santos.
Perto dali, o pastor Nivaldo de Oliveira, 35, está terminando de construir sua igreja -uma Assembléia de Deus que funciona onde antes havia uma garagem. Os cultos -quatro por semana- já reúnem mais de 50 pessoas.



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