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Após 47 anos, dona Jô deixa direção da Apae
Mãe de Zeca, portador de síndrome de Down que morreu aos 52 anos, ela ajudou a criar a entidade paulista há quase 50 anos
O filho caçula assume seu lugar e quer obter recursos para instituto de pesquisas que melhorem a vida dos deficientes intelectuais
CLÁUDIA COLLUCCI
DA REPORTAGEM LOCAL
Após 47 anos na direção da
Apae de São Paulo, Jolinda
Garcia dos Santos Clemente, a
dona Jô, deixa o cargo para passá-lo ao filho caçula, o publicitário Cássio Clemente, 49, nome de peso da propaganda brasileira. Aos 81 anos, dona Jô
quer se dedicar exclusivamente
aos cuidados da saúde do marido, o médico Antonio Clemente Filho, 87, com quem é casada
há mais de 60 anos. Ele sofre de
perda de memória.
"Meu marido, que sempre foi
meu apoio, meu braço direito,
está senil, tem dificuldades de
memória. Está na hora de eu
me dedicar a ele. Há muita
cumplicidade entre nós. Ele
nem precisa falar e eu já sei o
que ele quer", diz ela, com os
olhos marejados.
Mãe de quatro filhos, entre
eles Zeca, portador da síndrome de Down, dona Jô conseguiu em quase meio século de
atividade mobilizar a sociedade
paulista em prol da inclusão
dos deficientes intelectuais e
mostrar que o isolamento imposto a eles era equivocado. Zeca viveu de forma independente, morou sozinho e morreu,
em 2001, aos 52 anos.
Graças à primeira "feira da
bondade" que organizou, em
1966, ela obteve recursos para
construir a sede da Apae, em
um terreno cedido pela prefeitura. De lá para cá, diz ter perdido as contas de quantas vezes já
bateu na porta dos maiores empresários do país, pedindo doações à entidade.
Em suas festas beneficentes,
essa marqueteira social já conseguiu reunir no mesmo local
os banqueiros Olavo Setubal
(Itaú), Joseph Safra e Lázaro
Brandão (Bradesco). "Nem a
Febraban [Federação Brasileira de Bancos] consegue isso",
brinca o filho Cássio, que agora
ocupa a diretoria de eventos e
promoções da instituição, cargo que era da mãe.
Dona Jô diz que vai ajudar o
filho na transição. "Estou pronta para levantar e ir com ele
conversar com um banqueiro,
enfim, ajudar no que precisar.
Agora serão novas idéias. Eu tenho que ficar quieta no meu
canto para que ele crie a maneira dele de trabalhar."
Para Cássio, a mãe será "insubstituível" na Apae. "O que
eu vou fazer é tentar dar continuidade ao que ela estava fazendo mais do que bem." Segundo ele, a Apae, presidida pelo promotor de Justiça Fábio
Bechara, conquistou uma estabilidade financeira graças aos
serviços que oferece.
Hoje a instituição é muito
mais do que uma entidade assistencial. Possui, por exemplo,
um laboratório que fez, em
2007, 1,2 milhão de exames de
triagem neonatal, o "teste do
pezinho", e figura entre os três
maiores laboratórios do mundo nesse tipo de exame. A Apae
também presta consultorias a
órgãos de saúde, além de desenvolver projetos de capacitação a empresas que, por força
de lei, precisam reservar de 2%
a 5% de suas vagas a portadores
de deficiências.
"Se a gente fosse olhar a Apae
apenas como entidade assistencial, estaria resolvido. Mas a
gente sempre está olhando para a frente. E uma questão que
está em pauta, e que sempre foi
o sonho da minha mãe: como é
que a gente pára de fazer nascer
deficiente intelectual?", questiona o publicitário.
Projetos
É aí que entram os primeiros
planos da gestão de Cássio na
Apae. Ele pretende obter recursos para alavancar um instituto
de pesquisas focado no desenvolvimento de estudos de prevalência de doenças genéticas,
de mapeamento do genoma e
de novas tecnologias que tragam mais qualidade à vida dos
deficientes.
"Para isso precisamos de nova entrada de dinheiro, de motivar parceiros para nos ajudar
nisso", afirma o novo diretor,
que ainda não sabe qual o total
de recursos necessários para
montar o instituto.
Para o segundo semestre
deste ano, a instituição deve
realizar um congresso internacional que pretende reunir as
maiores autoridades do mundo
de áreas que podem interagir
com o universo da deficiência
intelectual. Um exemplo é Nicolas Negroponte, professor do
laboratório de multimídia do
Massachusetts Institute of
Technology (MIT).
"Queremos saber, por exemplo, como a informática pode
ajudar deficientes intelectuais
de uma maneira mais tranqüila
na sociedade. Dá para fazer um
teclado, uma tela mais amigável ao deficiente intelectual?"
Segundo Cássio, a idéia é que
esse primeiro congresso, que
deve ocorrer a cada dois anos,
dê subsídios para o desenvolvimento de vertentes que vão
orientar as linhas de pesquisa
do instituto.
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