São Paulo, domingo, 10 de junho de 2007

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Teste comparativo avalia pagode lésbico e frenesi gay

Festa das mulheres termina quando a outra está praticamente começando

Balada dos rapazes tem drogas alucinógenas e estimulantes; moças se arriscam na pista com espetinho de carne e cerveja

PAULO SAMPAIO
DA REPORTAGEM LOCAL

Nada mais instrutivo para entender a diversidade homossexual do que ir a uma festa de lésbicas, com churrasco e pagode, e a uma de gays, cheia de homens bombados dançando com o peitão de fora.
Realizadas respectivamente na quarta e na quinta-feira da semana passada, na boate The Week, as duas são tão radicalmente diferentes que uma termina na hora em que a outra está praticamente começando.
Marcada para as 16h, com churrasco, a festa das lésbicas esquenta com a apresentação de um grupo de pagode que faria os gays abandonarem a pista em disparada. O "Meninas do Ressaca" toca sucessos como "Vou Festejar" ("Você pagou com traição/a quem sempre lhe deu a mão"), celebrizado na voz da sambista Beth Carvalho.
A dos gays começa por volta das 2h, sem preâmbulos; um dos cinco DJs contratados para manter a pista abarrotada toca o que chamam de "hard house" - música eletrônica de embalo, que leva um bando de musculosos descamisados a um frenesi crescente de pulos e gritos. O ritmo faria uma lésbica cervejeira bufar de exaustão logo nos primeiros passos.
Justiça seja feita: enquanto boa parte dos rapazes está aditivada com ecstasy, cocaína, "K" (alucinógeno), GHB (euforizante) e Ice (estimulante cerebral), as moças se arriscam na pista só com espetinho de picanha e cerveja no estômago.
"Os gays malham a semana inteira, juntam dinheiro para vir à balada e idealizam esse dia como se fosse o último da vida deles", diz o produtor Beto Matte, 35, por volta das 5h. De acordo com Matte, ninguém quer realmente nada com ninguém, apenas exibir o corpo esculpido, caçar quem tem droga e, aí sim, beijar vários.
Habitualmente, a The Week é freqüentada apenas por gays, mas na semana da parada abriu excepcionalmente as portas para a festa das lésbicas.
Até a dinâmica do evento muda: no espaço onde gays costumam se amontoar sem camisa, as lésbicas bebericam em mesas de plástico colocadas ali para sua festa.
"A gente não tem tanta preocupação com o físico, não usa drogas e procura relações estáveis", diz a dupla Márcia Batista, 46, gerente administrativa, e Heloísa Silva, 48, economista, que comemora "bodas de prata" agora em julho.
No figurino, a lésbica não vai muito além do jeans com camiseta, ou camisa social masculina (adoram as listradas); as "sussa" (sossegadas) preferem o conforto de um abrigo largão. Há algumas usando paletó com a manga dobrada e sapatênis.
Entre os gays, o céu é o limite. Embora a esmagadora maioria vá acabar com o tórax de fora, ao chegar eles vestem camisetas muito justas e decotadas, com nomes de estilistas famosos em letras garrafais, ou números grandes, e grifes, muitas grifes; casacos com peles, eventualmente óculos escuros e boné (por causa da calvície).
"Só uso tênis Puma, tenho sete pares", contabiliza o publicitário Thiago Guez, 23, 1,95m, 95 kg. São 3h25 quando ele entra na boate vestindo um casaco debruado de pele "comprado em Paris", jeans Diesel e uma camisa Zara. Usa perfume Jean Paul Gaultier, mas seu preferido é o 212, de Carolina Herrera.
Na festa lésbica, assim que o grupo de pagode sai do palco e o DJ Marcos Paulo assume as picapes, o salão dá uma esvaziada (elas preferem música ao vivo).
"Tenho de tocar MPB, anos 80 e pop comercial, porque elas ouvem mais rádio que os gays", explica o DJ.
Entre si, os gays se chamam no feminino: "Onde a senhora está, bicha!?", pergunta um rapagão musculoso, no celular, a um amigo, na porta da boate.
Mais sérias, as lésbicas jamais se referem umas às outras por "sapatão". O máximo a que se permitem é um "sapa". "Em geral, usamos para nos certificar se alguém é ou não (sapa), entende?", explica a microempresária Sônia Gomes, 46.
A defasagem geracional parece maior entre lésbicas do que gays. As mais novas consideram as mais velhas "pesadas". Marcela, 26, que integra um grupo de meninas magrinhas, de cabelo comprido e "atitude Sandy", aponta para um grupo de quarentonas que bebem em uma das mesinhas.
"Detesto essas que usam pochete e celular na cintura. Não andaria nem sequer ao lado de uma." Todas concordam, rindo (elas são nítida minoria).
Entre os gays, a estética de um jovem de 20 e a de um senhor de 50 é praticamente a mesma: infantilizados, os mais velhos não temem parecer decadentes pulando sem camisa, gritando e beijando muitos.
No fim das festas, a impressão é que há apenas um ponto em comum entre os grupos: a homofobia de muitos. "As meninas bonitas não estão nessa festa porque não querem se misturar. Elas são bissexuais", acha a estudante Aline, 18.
O engenheiro Augusto, 35, acredita que "os gays não gostam de bichas". "Ele ficam com vários aqui na boate porque está tudo escuro, o som é muito alto e não é preciso ouvir a voz (fina) de ninguém. No dia-a-dia, sem nada na cabeça, a música é outra."


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