São Paulo, domingo, 10 de agosto de 2008

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Lei seca ignora prevenção, diz advogado

Bernardes Jr., da OAB-SP, critica governo por permitir propaganda de cerveja no rádio e na TV em qualquer horário

"Você pune o sujeito que toma meia lata e dirige, mas ele é bombardeado logo de manhã com anúncios dessa cerveja na TV", ele afirma

RICARDO WESTIN
DA REPORTAGEM LOCAL

Ao criar a lei seca, o governo se preocupou mais com a punição de quem dirige alcoolizado do que com a prevenção, afirma o advogado Francisco de Paula Bernardes Jr., da comissão de direito criminal da OAB-SP (seccional São Paulo da Ordem dos Advogados do Brasil).
Para ele, é contraditório que o governo adote valores diferentes para definir o que é bebida alcoólica. Pela lei seca, basta ter 0,5 grau Gay-Lussac. Pela lei que restringe a publicidade no rádio e na TV à madrugada e ao fim da noite, a concentração alcoólica deve ser de ao menos 13 graus. Enquanto o uísque tem restrições, a cerveja é livre.
"Você pune o sujeito que toma meia lata e dirige, mas ele é bombardeado logo de manhã com anúncios dessa cerveja na TV", diz o advogado.
Em janeiro, a Presidência levou ao Congresso, com regime de urgência, um projeto que teria evitado a contradição, baixando o teor alcoólico para fins de publicidade a 0,5 grau. Em maio, o governo retirou a urgência -deputados acusaram o lobby das empresas de cerveja e publicidade. O texto agora pode levar anos para ser votado.

 

FOLHA - As bebidas alcoólicas têm mais de uma definição legal...
FRANCISCO DE PAULA BERNARDES JR.
- A nova lei seca estipula como bebida a que tem pelo menos 0,5 grau Gay-Lussac. O motorista que dirige com uma concentração mínima de álcool no sangue comete uma infração gravíssima, paga multa, perde a carteira e tem o carro apreendido. Se a quantidade de álcool for um pouco mais alta, ele pode ser preso em flagrante e responder a inquérito e até a uma ação penal. Ao mesmo tempo, a lei que restringe a propaganda de álcool define como bebida a que tem ao menos 13 graus. Até 13 graus, a publicidade é liberada em qualquer horário. A legislação não é tão rigorosa com a propaganda como é com o motorista. É uma contradição.

FOLHA - Então o motorista está em desvantagem?
BERNARDES JR.
- Está, porque não é educado nem orientado.
É apenas punido. Você pune o sujeito que toma meia lata, mas ele começa a ser bombardeado logo de manhã com anúncios dessa cerveja na TV. A lei da publicidade só restringe a propaganda da bebida com mais de 13 graus Gay-Lussac [permitida das 21h às 6h]. É contraditório você ter uma lei de trânsito que proíbe o sujeito de dirigir tendo uma quantidade pequena de cerveja no sangue e uma lei de publicidade que só restringe a bebida mais forte.

FOLHA - Qual seria a solução?
BERNARDES JR.
- Temos de adequar a lei da publicidade. O mais coerente é que os anúncios de cerveja mencionem que a ingestão dessa latinha torna o motorista um infrator. Mas a mudança da lei teria de passar por ampla discussão. Já que a política é diminuir os acidentes de trânsito, que a prioridade seja a prevenção. A lei seca tem tido efeito positivo. Mas conhecemos o Brasil, as coisas são momentâneas. A lei deve cair no esquecimento, e a fiscalização deve ser relaxada. A prevenção é algo de médio e de longo prazo e, por isso, mais eficaz.


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