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Apenas 1/3 dos alunos conclui o curso para entrar no Bope
Gritos e tapas são comuns nos 4 meses de formação dos "caveiras"; Wagner Moura quebrou nariz de capitão da reserva em minitreinamento para o filme
DA SUCURSAL DO RIO
O Curso de Operações Especiais (COEsp) do Bope é um rito de passagem, que cria a identidade nova de "caveira", segundo oficiais da PM e do Exército que coordenaram treinamentos do gênero.
Só um terço dos inscritos resiste aos quatro meses de pouco sono e assédio dos capitães
Nascimentos da vida real.
Em 2002, o tenente PM Targa, 25, morreu de hipotermia
em atividade na água.
É na "semana do inferno",
que pode durar até os 15 primeiros dias de curso, que começa a "metamorfose". Os alunos perdem a identidade anterior: a cabeça é raspada, para ficarem parecidos, e cada um recebe um número.
Sofrem com déficit de sono,
de alimentação e de conforto,
exauridos por exercícios físicos
constantes -o objetivo é que
não pensem nisso em momentos críticos.
Toda falha é potencializada,
aos gritos, de forma agressiva e
ofensiva, para atacar os brios
-apesar de o PM ser chamado
de "senhor".
"Pede para sair!"
Em 16 edições, foram 151 formados, entre oficiais e sargentos -menos de 10 por curso. Já
cabos e soldados foram 165 em
15 edições -média de 11. Ganham o broche de "Caveira" e
vêem seu nome em um quadro
de honra, na parede de um salão do Bope.
"O tapa na cara é tão básico...
O curso testa os limites a todo
momento. É pressão constante,
e o Operações Especiais não
pode reagir violentamente.
Agressões morais e físicas são
"naturalizadas". É comum, em
encontro de "caveiras", que um
dê tapa na cara do outro, de
brincadeira. Naturaliza-se a adversidade", afirma o ex-capitão
do Bope Storani, coordenador
de um COEsp.
O objetivo, justifica, é formar
PM com "agressividade controlada, controle emocional, disciplina consciente, espírito de
corpo, flexibilidade, honestidade, iniciativa, lealdade, liderança e perseverança" -esses são
os "mandamentos" pintados na
parede.
Só voluntários
"Ninguém pede que venha,
só temos voluntários, e meu
trabalho é transformá-lo em
um profissional de elite", diz o
atual comandante do Bope, Pinheiro Neto, ex-instrutor.
O Curso de Ações Táticas
(CAT), uma porta de entrada
do Bope que formou 449 PMs, é
menos árduo e dura cinco semanas, mas segue princípios
semelhantes -embora sejam
enfatizadas ações táticas, como
de resgate de reféns e patrulhas
em favelas.
O coronel da reserva do
Exército Cláudio Barroso Magno, comandante do contingente brasileiro no Haiti até junho,
perdeu dois dedos da mão direita em combate contra a organização Sendero Luminoso,
durante um curso de Comandos (semelhante ao COEsp), no
Peru.
Barroso Magno, que reformulou o Curso de Comandos
do Exército em 2000 e 2001
-como comandante do Batalhão de Forças Especiais-, diz
que o objetivo é selecionar lideranças e testar a resistência psicológica e física, e a coragem física e moral do soldado.
"A lógica é levar o cara ao limite porque ele passa a se conhecer, mostra virtudes e atitudes que podem contra-indicá-lo. Então, leva muita porrada
mesmo. Bate na cara, com a
mão mesmo. Apanhei muito",
relata o coronel.
Storani relata que a rusticidade do treinamento dificulta a
readaptação à vida normal de
gente que passa por ele. "Passei
uma semana dormindo no
chão. Acordava de madrugada
para arrumar a mochila, equipamento, para correr. Não era
só eu, é recorrente. Tem gente
que dorme no chão até hoje."
Ator enfurecido
O capitão da reserva preparou os atores de "Tropa de Elite" e teve o nariz quebrado por
Wagner Moura, o capitão Nascimento, em acesso de fúria,
durante minitreinamento.
"Eu o subestimei, não sabia
que fazia boxe tailandês, errei.
Mas não me matou: doeu, sangrou à beça, coloquei o nariz no
lugar, ele machucou a mão, mas
acontece. Potencializa-se o estresse físico, o que deixa a pessoa mais sensível à irritação e à
agressão psicológica", disse.
O ex-secretário nacional de
Segurança Pública José Vicente da Silva Filho, coronel da reserva da PM de São Paulo, afirma que "absurdo é enfrentar
tiroteio".
"Nada do treino dá minimamente o cagaço do cara sente
quando chove bala. Ele aprende a obedecer a ordens com rapidez. Não se pode pôr na lousa,
no PowerPoint. É para ver
quem tem estrutura emocional. Democracia é no Congresso", ri Silva Filho.
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