São Paulo, domingo, 11 de janeiro de 2004

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No Morro do Índio, taxa foi de 208 assassinatos para 100 mil, contra 44 para 100 mil da cidade

Mortes violentas superam as de São Paulo

DA REPORTAGEM LOCAL

Apontado como um dos locais prioritários pelo plano de ação do Jardim Ângela, o bairro Morro do Índio registrou taxa de 208 assassinatos para cada 100 mil habitantes em 2002. Esse número é cinco vezes o da cidade de São Paulo, onde a proporção foi de 44 para cada 100 mil. Em Cali (Colômbia), uma das cidades mais violentas do mundo, foram assassinados 91 em cada grupo de 100 mil.
As estruturas viária e de moradia revelam a interdependência perversa entre a organização do espaço e a violência. Como afirma o próprio estudo, "o morro é uma espécie de "fortaleza" de difícil e reduzido acesso viário, facilmente controlável pelo crime".
Segundo policiais da região, a presença do tráfico combinada com a habitação precária contribuem para a banalização da violência. Uma briga por causa de lixo colocado na porta de um vizinho, por exemplo, já resultou em assassinato. Para os policiais, essa cultura da violência "incentiva" os crimes passionais, motivados por desentendimentos fúteis.
Toda a região atendida pela delegacia que cuida também do Morro do Índio tem de dez a 15 homicídios por mês, de acordo com a polícia. Desses, 70% ocorrem por desentendimentos entre bandidos, 20% em razão de crimes "passionais" e 10% por violência contra moradores. A estatística é da própria delegacia.

Rua Tijuape
A principal rua, a Tijuape, tem pouco mais de um quilômetro, mas sete moradores foram assassinados em 2002.
Além de expor a criminalidade, essa estatística é indicadora de outro problema apontado pelo estudo: a falta de integração viária. Da rua Tijuape sobem escadões para barracos cujo acesso se dá somente por esses degraus. Então, o endereço de todas essas moradias, na prática, é o dessa via.
Ao todo, houve 21 homicídios no Morro do Índio em 2002, em uma área em que vivem cerca de 10 mil pessoas. No ano anterior, foram 19 assassinatos.
A reportagem da Folha ouviu dezenas de moradores da rua Tijuape. Todos apontaram pontos em que, há poucos meses ou anos, presenciaram assassinatos -de manhã, à tarde, à noite.
Dono de um bar e morador da região há 25 anos, quando as casas eram poucas, Jovino, 68, conta que um de seus cinco filhos foi assassinado poucos anos atrás, quando voltava do trabalho. Segundo ele, "estava com a marmita na mão". Mas ele não gosta de entrar em detalhes. "Se abrir a boca, eles [traficantes] fecham."
A dez metros de seu bar, dois mecânicos trabalham para consertar a roda de um Fusca. Eles também não revelam seus nomes, mas dizem que até pouco tempo atrás ali funcionava outro bar. Segundo um deles, fechou depois que um frequentador foi morto.
O casal Odair, 59, e Eunice da Silva, 50, afirma que o bairro melhorou. "Antes era todo final de semana, agora é mais calmo", fala Odair, que está aposentado. De acordo com seu relato, antes havia dias em que não conseguia sair de casa para ir trabalhar porque os criminosos fechavam a rua, a única saída do bairro.
A Tijuape começa na estrada do M'Boi Mirim e vai até o alto do Morro do Índio, um exemplo do esquema "espinha de peixe" definido pelo estudo. Apesar da proximidade dessa estrada, o local também é distante para a polícia. A delegacia que cuida da área fica na outra via estrutural da região, a estrada de Itapecerica, que forma um "V" com a M'Boi Mirim. Chegar por dentro, pelos becos e vielas, é quase impossível. (PDL)


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