São Paulo, terça-feira, 11 de março de 2008

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entrevista

Estou com gosto amargo na boca, diz espanhola barrada

DANIEL KAZ
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, DE MADRI

A agente de viagens Francisca García, 24, nunca tinha ouvido falar da "crise" entre Brasil e Espanha causada pelo número crescente de "inadmissões" de brasileiros no aeroporto de Barajas, em Madri. Mas na última quinta-feira ela se viu envolvida numa disputa diplomática sem nem saber o motivo.
Francisca e outros seis espanhóis que tiveram a entrada negada no aeroporto de Salvador, apesar de viajar a trabalho, com 130 (cerca de R$ 380) em espécie, cartão de crédito internacional, passagem de volta e reserva para uma semana em hotel cinco estrelas.
Traumatizada, ela diz não querer voltar ao Brasil tão cedo e promete não vender nenhum pacote de viagem para o país, ainda que seja bisneta de brasileiro.  

FOLHA - Por que você viajou para o Brasil na quinta-feira?
FRANCISCA
- Fui convidada por uma operadora de viagens para passar uma semana no Brasil conhecendo o destino turístico para depois tentar vendê-lo aos meus clientes. Viajei com um grupo de uns 20 agentes e uma encarregada da agência.

FOLHA - O que aconteceu quando você chegou ao setor de imigração do aeroporto de Salvador?
FRANCISCA
- Pegaram meu passaporte e o olharam por muito tempo. Me perguntaram se eu tinha hotel e pediram o comprovante da reserva. Confirmei que tinha reserva no hotel Vila Galé, mas que o comprovante estava com a encarregada da agência. Me levaram para uma sala com umas 20 pessoas. Ficamos ali por quase uma hora, depois nos chamaram de novo para o controle de entrada. Ali me perguntaram quanto tempo eu ficaria, pediram que eu mostrasse a passagem de volta e quiseram saber quanto dinheiro eu tinha. Mostrei 130 em espécie e meu cartão de crédito internacional. Levei pouco dinheiro porque todos os gastos seriam pagos pelo operador que nos convidava. Levei alguma coisa só para uma lembrancinha.

FOLHA - A responsável pela agência ainda estava com você nesse momento?
FRANCISCA
- Sim. Ela explicou a situação, mas não adiantou. Depois de quase uma hora deixaram ela e mais algumas pessoas passarem. Do grupo, eu e mais cinco fomos impedidos de entrar. Tinha ainda um casal. Deixaram a mulher passar, mas não deixaram o homem. Por isso a mulher resolveu ficar conosco e não entrou.

FOLHA - Você perguntou aos policiais porque não foi admitida?
FRANCISCA
- Perguntei, mas eles não me responderam. Queria saber o motivo de não nos deixarem entrar e quando nos devolveriam os passaportes. Disseram que iam nos mandar de volta e que receberíamos os passaportes quando chegássemos em Madri. Expliquei que tinha ido vender o Brasil para os espanhóis. Insisti tanto que me mandaram ficar sozinha num canto da sala.

FOLHA - Em algum momento os policiais foram agressivos?
FRANCISCA
- Agressivos, não, mas quase não nos deram explicações. Uma das pessoas, que falava português, perguntou o que estava acontecendo. Responderam em português. Não entendi nada. Em seguida nos escoltaram até o avião. O policial entregou os passaportes para a aeromoça e deu instrução de só repassá-los para a polícia em Madri. Me senti como uma delinqüente. Não sou uma delinqüente. Estava indo ao Brasil para mandar gente da Espanha para lá.

FOLHA - Quanto tempo vocês ficaram na sala esperando para serem reembarcados para a Espanha? Como foram tratados?
FRANCISCA
- Foram cerca de três horas. Não havia nada para comer nem para beber. Liguei para a minha família, para o meu namorado e para a minha agência de viagens para acalmá-los. Fiquei 34 horas fora de casa, com a roupa do corpo, sem comer direito.

FOLHA - Por que você acha que impediram sua entrada?
FRANCISCA
- Não sei. Meus papéis estão em ordem. Quando voltei para casa, li nos jornais que era uma represália porque tinham impedido a entrada de 30 brasileiros na Espanha. A verdade é que me dá muita pena. Meu bisavô era brasileiro. Tinha muita vontade de conhecer o Brasil. O país me deixou com um gosto amargo na boca.

FOLHA - Pretende voltar ao Brasil algum dia?
FRANCISCA
- Não quero voltar tão cedo. E não vou mandar ninguém daqui para lá. Não quero que aconteça com um cliente meu a mesma coisa que aconteceu comigo.


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