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entrevista
Estou com gosto amargo na boca, diz espanhola barrada
DANIEL KAZ
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, DE
MADRI
A agente de viagens Francisca García, 24, nunca tinha
ouvido falar da "crise" entre
Brasil e Espanha causada pelo número crescente de
"inadmissões" de brasileiros
no aeroporto de Barajas, em
Madri. Mas na última quinta-feira ela se viu envolvida
numa disputa diplomática
sem nem saber o motivo.
Francisca e outros seis espanhóis que tiveram a entrada negada no aeroporto de
Salvador, apesar de viajar a
trabalho, com 130 (cerca
de R$ 380) em espécie, cartão de crédito internacional,
passagem de volta e reserva
para uma semana em hotel
cinco estrelas.
Traumatizada, ela diz não
querer voltar ao Brasil tão
cedo e promete não vender
nenhum pacote de viagem
para o país, ainda que seja
bisneta de brasileiro.
FOLHA - Por que você viajou para o Brasil na quinta-feira?
FRANCISCA - Fui convidada
por uma operadora de viagens para passar uma semana no Brasil conhecendo o
destino turístico para depois
tentar vendê-lo aos meus
clientes. Viajei com um grupo de uns 20 agentes e uma
encarregada da agência.
FOLHA - O que aconteceu quando você chegou ao setor de imigração do aeroporto de Salvador?
FRANCISCA - Pegaram meu
passaporte e o olharam por
muito tempo. Me perguntaram se eu tinha hotel e pediram o comprovante da reserva. Confirmei que tinha reserva no hotel Vila Galé, mas
que o comprovante estava
com a encarregada da agência. Me levaram para uma sala com umas 20 pessoas. Ficamos ali por quase uma hora, depois nos chamaram de
novo para o controle de entrada. Ali me perguntaram
quanto tempo eu ficaria, pediram que eu mostrasse a
passagem de volta e quiseram saber quanto dinheiro
eu tinha. Mostrei 130 em
espécie e meu cartão de crédito internacional. Levei
pouco dinheiro porque todos
os gastos seriam pagos pelo
operador que nos convidava.
Levei alguma coisa só para
uma lembrancinha.
FOLHA - A responsável pela
agência ainda estava com você
nesse momento?
FRANCISCA - Sim. Ela explicou a situação, mas não
adiantou. Depois de quase
uma hora deixaram ela e
mais algumas pessoas passarem. Do grupo, eu e mais cinco fomos impedidos de entrar. Tinha ainda um casal.
Deixaram a mulher passar,
mas não deixaram o homem.
Por isso a mulher resolveu ficar conosco e não entrou.
FOLHA - Você perguntou aos policiais porque não foi admitida?
FRANCISCA - Perguntei, mas
eles não me responderam.
Queria saber o motivo de não
nos deixarem entrar e quando nos devolveriam os passaportes. Disseram que iam
nos mandar de volta e que receberíamos os passaportes
quando chegássemos em
Madri. Expliquei que tinha
ido vender o Brasil para os
espanhóis. Insisti tanto que
me mandaram ficar sozinha
num canto da sala.
FOLHA - Em algum momento os
policiais foram agressivos?
FRANCISCA - Agressivos, não,
mas quase não nos deram explicações. Uma das pessoas,
que falava português, perguntou o que estava acontecendo. Responderam em
português. Não entendi nada. Em seguida nos escoltaram até o avião. O policial entregou os passaportes para a aeromoça e deu instrução de
só repassá-los para a polícia
em Madri. Me senti como
uma delinqüente. Não sou
uma delinqüente. Estava indo ao Brasil para mandar
gente da Espanha para lá.
FOLHA - Quanto tempo vocês ficaram na sala esperando para serem reembarcados para a Espanha? Como foram tratados?
FRANCISCA - Foram cerca de
três horas. Não havia nada
para comer nem para beber.
Liguei para a minha família,
para o meu namorado e para
a minha agência de viagens
para acalmá-los. Fiquei 34
horas fora de casa, com a
roupa do corpo, sem comer
direito.
FOLHA - Por que você acha que
impediram sua entrada?
FRANCISCA - Não sei. Meus
papéis estão em ordem.
Quando voltei para casa, li
nos jornais que era uma represália porque tinham impedido a entrada de 30 brasileiros na Espanha. A verdade é que me dá muita pena. Meu
bisavô era brasileiro. Tinha
muita vontade de conhecer o
Brasil. O país me deixou com
um gosto amargo na boca.
FOLHA - Pretende voltar ao Brasil algum dia?
FRANCISCA - Não quero voltar
tão cedo. E não vou mandar
ninguém daqui para lá. Não
quero que aconteça com um
cliente meu a mesma coisa
que aconteceu comigo.
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