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DANUZA LEÃO
Lógica feminina
Somos todos justos, incapazes
de uma mentira, os reis da
ética. Ao mesmo tempo podemos
ser falsos e enganar com a cara
mais limpa do mundo, de forjar
provas, de destruir indícios, desde
que seja para defender os que
mais amamos.
A nora telefona aos prantos dizendo que o marido (seu filho) foi
visto entrando num motel com
uma perua. Qual a mãe que nessa
hora não jura, sobre a Bíblia e o
Alcorão, que naquele exato momento ele, como filho exemplar,
estava indo com ela ao hospital,
para fazer uma radiografia da
perna? E se for preciso engessa a
perna, para dar mais veracidade
ao fato. Falta de caráter? Não;
apenas amor, quando todos os
pecados são perdoados.
Qual a mãe que não jura à diretora da escola, olho no olho, que
sua filha estava ardendo em febre
no dia da prova? E ainda faz
mais: traz um atestado médico,
aliás vários, com todos os carimbos -médico amigo é para isso.
As religiões diriam que estão todas em pecado; as leis, que são todas criminosas, se arriscando a
alguns anos de reclusão, essas
bobagens. Mas a consciência dessa mãe está tranqüila: por amor,
vale tudo.
As mulheres têm uma lógica
própria e uma vocação irresistível
para infringir as leis, não por desrespeito, mas por senso prático. Se
não está prejudicando ninguém,
qual o problema?
Uma mulher digna de pertencer
ao sexo feminino é capaz de caluniar, difamar, até fazer uma denúncia falsa à Justiça, se alguma
vadia ousar bater as pestanas para seu marido. Ela é capaz de sustentar qualquer mentira sem o
menor pudor: afinal, mentiu para
defender a família e o lar, causas
muito justas e nobres.
Mulher é assim: se ela desconfiar que aquele jantar com um
cliente não é bem assim, o mínimo que faz é, na hora dele sair,
pingar uma gota de azeite bem
no meio da gravata sem o menor
remorso.
Se tiver uma ajuda, falsifica a
identidade e o passaporte com a
maior naturalidade. Afinal,
quem não quer ter dez anos a menos? E está prejudicando alguém?
Esse é o seu grande argumento, e
temos que lhe dar razão: trocar
um numerozinho do ano em que
nasceu não mata ninguém, e qual
juiz seria insensível a tal argumento? Afinal, dependendo da
idade do namorado, chega a ser
uma questão de sobrevivência.
E tem mais: sem o menor escrúpulo ela usa os filhos para confirmar todas as mentiras que disse, e
ai de quem ousar dizer que ela está dando um péssimo exemplo.
Nessa hora, com o brilho de um
grande criminalista, ela defende
a tese de que está ensinando seus
filhos a lutar pelo que querem.
Mas vamos supor que dê tudo
errado. O marido, com aquela lógica masculina insuportável, se
horroriza; o médico recusa o atestado e a diretora do colégio fala
em expulsar seu filho. Pior que
tudo: é processada por falsidade
ideológica e os jornais estampam
sua verdadeira idade, olha o
vexame.
Aí, só tem um jeito: continuar a
fazer seu papel de mulher e chorar. No princípio, só com os olhos
marejados; numa segunda fase,
com o lencinho já na mão, para
as lágrimas que vão brotar.
Ninguém vai resistir, nem mesmo o marido. Talvez a diretora
do colégio perceba, mas só ela.
Que, como mulher, vai certamente entender.
E-mail - danuza.leao@uol.com.br
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