São Paulo, sexta-feira, 11 de setembro de 2009

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Governo estuda liberar uso de diesel em carro de passeio

Legislação só permite o combustível em caminhões, caminhonetes e outros veículos comerciais

Críticos da medida afirmam que diesel é mais poluente do que o álcool e que o país não produz a quantidade necessária do combustível


HUMBERTO MEDINA
MARTA SALOMON
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

RICARDO RIBEIRO
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

O governo estuda liberar o uso de óleo diesel em automóveis de passeio. De acordo com o ministro Edison Lobão (Minas e Energia), os estudos estão sendo feitos pela Petrobras.
"O fato é que devemos nos preparar para essa possibilidade", afirmou ontem o ministro, durante audiência pública sobre o pré-sal no Senado. Ele não esclareceu o que motivou a realização dos estudos.
Há mais de 30 anos, a legislação brasileira só permite o uso do diesel em caminhões, caminhonetes e outros veículos comerciais. Na Europa, a associação de fabricantes estima em 52,7% a participação dos carros a diesel no mercado.
A indústria brasileira produz, para exportação, automóveis movidos a diesel, mas os motores são trazidos da Europa.
Lobão disse que a eventual liberação do diesel para uso em automóveis de passeio dependerá dos resultados das pesquisas: "Temos a preocupação de melhorar esse combustível [diesel], retirando dele o enxofre, e introduzir o biodiesel".
Os críticos ao uso do diesel por veículos de passeio apontam várias desvantagens na liberação do produto:
1) o diesel é mais poluente do que o álcool. Além disso, o diesel usado no Brasil tem uma quantidade de poluentes muito maior do que o usado na Europa -até 1.800 ppm (partes por milhão) de enxofre no Brasil, contra 10 ppm na Europa- e polui mais do que a gasolina;
2) apesar da autossuficiência na produção de petróleo, o Brasil não produz toda a quantidade de diesel de que precisa -no ano passado foram importados 5,8 bilhões de litros;
3) hoje, o diesel é mais barato (R$ 1,97 por litro) porque paga menos taxas do que o álcool (R$ 1,24/litro) e a gasolina (R$ 2,33/litro) por ser usado principalmente para o transporte coletivo. Se a demanda aumentar, essa vantagem pode ser eliminada pelo governo.
Ricardo Bock, professor de engenharia mecânica da FEI (Fundação Educacional Inaciana), afirma que, se o diesel for liberado, vai tirar mercado do carro "flex" e do carro a álcool.
"É um motor que rende mais, tem maior eficiência energética, aproveita melhor a queima de combustível e tem mais torque." Ou seja, a substituição pode acontecer porque o motor a diesel roda mais quilômetros por litro do que o carro a álcool.
Ildo Sauer, ex-diretor de Gás e Energia da Petrobras, disse que, desde 2000, a estatal investe para melhorar a estrutura de refino e aumentar a quantidade de diesel produzido no país. Isso, segundo Sauer, explicaria o eventual interesse em liberar o carro a diesel, apesar de o Brasil não ser autossuficiente no produto hoje.
"Não é uma ideia especialmente brilhante, defendemos combustíveis que poluam menos", disse o ministro Carlos Minc (Meio Ambiente), ao ser informado sobre o pronunciamento de Lobão.
"A qualidade do diesel brasileiro é ruim e aumentará a poluição", afirmou Eduardo Moreira, professor da Faculdade de Economia e Administração da PUC-SP. "Acho uma péssima ideia. Vai acabar com a vantagem competitiva do Brasil, que é o uso do álcool", disse Luiz Pinguelli Rosa, diretor da Coppe/UFRJ.
A Anfavea, entidade que reúne fabricantes de veículos, informou que a liberação do uso do diesel no Brasil não faz parte da agenda do setor. "Trata-se de uma questão de política energética, a Anfavea não comenta", afirmou a entidade.
A Petrobras disse que não tem atribuição de decidir sobre os tipos de veículos que usam diesel. Segundo a estatal, o que tem sido feito são melhorias nas refinarias para reduzir o teor de enxofre no combustível.


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