São Paulo, segunda-feira, 11 de novembro de 2002

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MATERIAL DE LIMPEZA

Mais de um terço da água sanitária consumida no país vem do mercado informal; soda cáustica é a principal vilã

Produtos clandestinos são mais tóxicos

Juca Varella/Folha Imagem
Loja de produtos de limpeza clandestinos localizada em São Mateus (zona leste de São Paulo)


CLÁUDIA COLLUCCI
DA REPORTAGEM LOCAL

Mais de um terço da água sanitária e dos desinfetantes consumidos no país são clandestinos, fabricados em fundos de quintal e vendidos a granel de porta em porta ou em pequenos comércios.
Acondicionados em garrafas plásticas descartáveis, sem especificação dos agentes químicos usados e da sua concentração, estão entre as principais fontes de intoxicação de crianças.
Os materiais de limpeza em geral são a segunda fonte de intoxicações no país. No ano de 2000, 6.762 pessoas foram parar em hospitais pela ingestão de algum desses produtos, segundo dados do Sinitox (Sistema Nacional de Informações Tóxico-Farmacológicas), que centraliza informações de 31 centros de controle de intoxicações de 17 Estados brasileiros.
Do total de intoxicados, 4.113 eram crianças de até dez anos de idade. Oito morreram e 13 ficaram com sequelas. Os números de 2001 ainda não estão fechados.
Não há cálculo oficial do número de intoxicações causadas por produtos clandestinos, mas, segundo médicos ouvidos pela Folha, eles estão presentes na maioria dos casos e, quando ingeridos, levam a intoxicações graves porque na sua composição há excesso de agentes químicos tóxicos.
Pesquisa feita pela Fipe (Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas) mostra que a água sanitária clandestina já responde por 42,1% do mercado nacional, enquanto o desinfetante, por 30,6%.
O estudo, realizado a pedido da Abipla (Associação Brasileira das Indústrias de Produtos de Limpeza), pesquisou 2.351 domicílios em São Paulo.
Na capital, o mercado informal de água sanitária concentra 37,4% das vendas e o de desinfetantes, 29,2%. A partir de um cruzamento com dados do IBGE, os técnicos calcularam o grau de informalidade no mercado nacional.
Segundo o Centro de Vigilância Sanitária de São Paulo, o comércio desse tipo de material na periferia virou uma "febre".
O pediatra Anthony Wong, 55, coordenador do Centro de Atendimento Toxicológico (Ceatox) do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP, afirma que a principal vilã é a soda cáustica, presente tanto na água sanitária quanto nos desinfetantes e, geralmente, usada em maior quantidade pelos clandestinos para estabilizar o produto.
Além de o contato com essa substância provocar queimaduras graves na pele e nos olhos, a ingestão causa sérias lesões internas. Entre as sequelas, ele cita a dificuldade para engolir, os problemas pulmonares e a possibilidade sete vezes maior do desenvolvimento de câncer no esôfago.
Além de serem mais tóxicos, os produtos clandestinos atraem as crianças por serem coloridos e acondicionados em garrafas de refrigerantes, segundo a médica toxicologista Darciléia Alves do Amaral, diretora do Centro de Controle de Intoxicações da Prefeitura de São Paulo.
"Quando encontram algo colorido embaixo da pia ou do tanque, logo levam à boca", comenta a médica, lembrando que as intoxicações ocorrem nos horários que antecedem as refeições, das 10h às 12h e das 17h às 20h, período em que a mãe está ocupada.
Também é comum, segundo ela, a ingestão dos produtos misturados com água, ou porque a criança bebe o líquido que está dentro do balde ou porque cai dentro do balde.
Segundo ela, entre os produtos de limpeza, a água sanitária é a campeã em número de acidentes. Dos 1.775 casos de intoxicação atendidos em 2001, 36% foram causados pelo produto.
A mesma proporção é verificada no ambulatório de toxicologia da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), segundo o médico Flávio Zambroni. "A intoxicação por produtos de limpeza está entre as maiores causas de doenças de crianças até cinco anos de idade", afirma.
Os médicos aconselham os pais a não fazerem a criança beber leite ou água nem provocarem o vômito. Dependendo do tipo de agente químico ingerido, o vômito pode provocar uma lesão interna ainda maior quando aspirado. A criança deve ser levada imediatamente a um pronto-socorro.



Em caso de intoxicação ligue para: 0800.148.110 (São Paulo), 0800.780.200 (Porto Alegre), 0800.410.148 (Curitiba), 0800.284.4343 (Salvador), 0800.643.5252 (Florianópolis)


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