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"Fazer parto normal virou desafio"
DA REPORTAGEM LOCAL
O ginecologista e obstetra Renato Kalil, que atende nos hospitais São Luiz e Albert Einstein, em
São Paulo, é considerado um dos
maiores estimuladores do parto
vaginal no sistema privado. Tem
no seu currículo partos em socialites, modelos e empresárias.
Em 2005, ele afirma que registrou um aumento de dez pontos
percentuais nos partos normais
em relação a 2004 -43% para
53%. Kalil diz que, além do prazer
do nascimento natural, fazer parto vaginal virou um desafio.
Segundo Kalil, muitos médicos
acabam amedrontando suas pacientes, especialmente as que passaram por cesáreas anteriores, a
fazer um parto vaginal, alegando
que o útero pode romper. A seguir, trechos da entrevista:
Folha - Os médicos não querem ou
não sabem fazer parto normal?
Renato Kalil - Quando você faz
muito parto normal desde a residência médica, você desenvolve
habilidade para a coisa, o que a
gente chama de ""ter mão". Quando tem mão, não tem medo.
Quando você não tem mão e o
chefe de plantão não está ao lado,
você opta pela cesariana porque
tem medo de eventuais complicações, que possam levar a um fórceps, por exemplo. Hoje, se o trabalho de parto está demorado ou
o nenê é grande, os médicos logo
indicando a cesárea. E, quanto
mais cesárea você faz, menos mão
[para parto normal] você tem.
Se você só opera, opera, opera,
você tem medo de arriscar e aí
não arrisca e opera. E, se você não
passa segurança para a mulher,
ela não acredita mais em você.
Folha - E a questão econômica,
não conta?
Kalil - Sim, conta e muito. Tem
muito médico no mercado, e não
há mercado para todos. Hoje, o
desespero de um recém-formado
é tentar entrar num convênio vagabundo -nem isso ele consegue. Se ele trabalha num convênio, ele não consegue ficar seis horas tocando um trabalho de oito,
dez, 13 horas. Ele precisa tocar o
consultório dele, onde a consulta
é de R$ 22. Já no parto, vai ganhar
os mesmos R$ 470, seja o normal
ou seja a cesárea.
Folha - As pacientes querem a cesárea?
Kalil - A mulher já vem predisposta à cesárea. Em geral, porque
as amigas fizeram cesárea e ficam
enchendo a cabeça dela de abobrinhas, dizendo que o parto vaginal dói muito etc. Aí junta com
o lado do médico que ganha a
mesma coisa. Ou seja, juntou o
útil ao agradável.
Folha - O sr. acha que remunerar
melhor o médico poderia melhorar
os índices de parto normal?
Kalil - Há alguns anos, os convênios começaram a divulgar que
iriam melhorar um pouco a remuneração do parto normal. Coisa de uns R$ 50. Sabe o que aconteceu? Começou a ter mais trauma de parto, muitas fraturas de
clavícula, por exemplo. Os médicos começaram a forçar o parto
normal. Se você não tem segurança, vá treinar. Não indique parto
normal se não tem confiança de
fazê-lo. A educação tem que ser
na faculdade. Não adianta pegar
médico formado e obrigá-lo a fazer parto vaginal.
(CC)
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