|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Samba de uma letra só
ESTÊVÃO BERTONI
DA REPORTAGEM LOCAL
O "flashback" carnavalesco é
um evento anual que atinge
parte dos foliões. Desencadeado pelos sambas-enredos entoados pelos quatro cantos, o
fenômeno causa a sensação de
"eu já conheço essa letra".
O ápice do déjà vu tem início
às 23h15 de hoje, quando as escolas do grupo especial do Carnaval de SP entram no Anhembi, com transmissão televisiva.
A explicação para isso é simples: a repetição de palavras,
expressões e ideias na trilha sonora dos desfiles é tão comum
que, se a MPB já teve seu samba
de uma nota só, assinado por
Tom Jobim, a festa paulistana
parece ter um único samba.
Por exemplo: em dez anos de
Carnaval em SP, quase 70% do
sambas usaram a palavra
"amor", campeã com 138 aparições nas 144 músicas analisadas pela Folha -em alguns casos, surge mais de uma vez numa letra. Anualmente, é a palavra que mais aparece, mas já foi
desbancada: em 2007, perdeu
para "mundo" e, em 2004, para
"São Paulo", por conta do aniversário de 450 anos da cidade.
A segunda posição fica com
"coração", seguida de "Carnaval", "vida", "mundo", "Brasil"
e "samba". Também são muito
frequentes os verbos "vem" e
"sou", que a Tom Maior vai
usar cinco vezes só neste ano.
Isoladamente, entretanto,
algumas escolas são campeãs
em citar o próprio nome. A Vai-Vai, por exemplo, que desfila
hoje, fez isso 11 vezes, de 2001
para cá -o samba que será cantado hoje está na conta.
Já a Leandro de Itaquera,
que não esteve no grupo especial em 2007 e 2008, tem "vida" como a palavra mais usada.
Uma pista para as repetições
vem dos próprios autores. Segundo Fabinho Simpatia, presidente da ala dos compositores da Tucuruvi, é comum que
um único autor faça sambas
para várias escolas no mesmo
Carnaval. E diz que muitos
possuem vícios de linguagem.
O compositor Maradona,
que já emplacou 122 sambas e
que costuma compor em parceria com mais quatro amigos,
tem participação em três sambas-enredos deste ano: da Tom
Maior, sua escola, da Leandro
de Itaquera e da Mocidade.
Ele diz que cada escola exige
um estilo de samba. Para uma
como a Gaviões da Fiel, ligada
ao futebol, a música tem que se
aproximar dos gritos das torcidas. Ele, que reconhece que os
sambas estão ficando repetitivos, inclusive na melodia, afirma que o uso de "amor" está na
necessidade de a escola contagiar seus integrantes para obter um bom desempenho.
O compositor Zeca do Cavaco, da Vai-Vai, não aprova o fato de um autor fazer músicas
para várias escolas. Segundo
ele, um compositor tem que
botar toda inspiração a favor de
uma escola. Ele diz não saber
como alguém pode fazer isso
com várias ao mesmo tempo.
Para o músico Paulinho da
Viola, o Carnaval tem dado
prioridade só ao visual e deixa
as composições em segundo
plano. Osvaldinho da Cuíca,
campeão três vezes pela Vai-Vai, diz o mesmo que Paulinho
e acrescenta: falta criatividade.
Texto Anterior: Telefonia: Anatel reforça veto a torpedo de operadora Próximo Texto: Desfiles de escolas paulistanas homenageiam cidades do Brasil Índice
|