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São Paulo, sábado, 12 de abril de 2003

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SAÚDE

Eduardo Massad, da USP, afirma, no entanto, que o resultado do seu modelo matemático da epidemia é preliminar

Sars pode ter alta transmissão, diz médico

CLAUDIO ANGELO
EDITOR-ASSISTENTE DE CIÊNCIA

Há cerca de dez dias, quando a pneumonia asiática tomou conta do noticiário no planeta, o infectologista Eduardo Massad, da Faculdade de Medicina da USP, resolveu fazer uma projeção em computador para prever como ela se espalharia. E se espantou com o resultado: no começo do segundo semestre, a doença poderá ter infectado nada menos que 800 milhões de pessoas.
O cálculo, feito com base nos dados divulgados diariamente pela OMS (Organização Mundial da Saúde) sobre a doença, ainda é preliminar. "Por enquanto, o modelo tem 10% de confiabilidade", avisa o médico. "Na semana que vem, poderá ter 60% ou 70%."
Mas Massad, que há 20 anos trabalha com modelos matemáticos de epidemias, diz estar "assustado" com o que seu computador mostrou sobre a superpneumonia. "Isso pode ser como a gripe de 1918 [que matou 20 milhões de pessoas"", disse à Folha.

Cálculo
Após examinar a sequência de dados sobre a pneumonia (também conhecida pela sigla Sars, ou síndrome respiratória aguda grave) disponibilizada pela OMS, o pesquisador da USP calculou a chamada taxa de reprodutibilidade da moléstia. Trata-se da razão entre o total de pessoas numa dada população que adoecem e que se recuperam, morrem da doença ou morrem de outras causas.
"É esse índice que traduz o ímpeto inicial da epidemia, sua aceleração", diz o médico.
Massad compara esse índice à relação entre uma caixa-d'água e seu ralo. Quando o ralo é maior que a torneira, a caixa-d'água esvazia mais rápido. No caso das doenças infecciosas, o "ralo" é o número de pacientes que se recuperam ou morrem.
Quando essa razão é maior que um, ou seja, o "ralo" é mais estreito, a caixa-d'água enche: a epidemia acontece. A Aids no Quênia nos anos 80 tinha um índice de transmissibilidade de 10 a 12 -o resultado foi uma epidemia devastadora na África.
A razão não tem a ver necessariamente com a letalidade do vírus. Em alguns casos, pelo contrário: o ebola, que mata mais de metade das suas vítimas, tem um "ralo" grosso demais: seu índice de transmissão menor que um, daí sua versão humana não ter conseguido sair do continente africano.
A pneumonia asiática tem um índice de transmissão igual a 2, o que garante a propagação epidêmica. O modelo matemático criado por Massad prevê, com base no atual crescimento do número de casos, que ela possa chegar a infectar 80% das pessoas suscetíveis -o que, segundo a OMS, equivale a cerca de 1 bilhão de seres humanos que se movimentam entre fronteiras diariamente.
"Não me parece um cálculo pouco razoável, porque o modelo é parecido com o do resfriado comum", afirmou Massad.
Nos últimos dias, a taxa de crescimento do número de casos tem diminuído. Mas, segundo o pesquisador da USP, para que isso tenha um impacto significativo na projeção, é preciso que a desaceleração seja brutal.
O número de mortos pela epidemia somava 116 casos até ontem, segundo a OMS.
O virologista Paolo Zanotto, do Instituto de Ciências Biomédicas da USP, pede calma na análise do modelo. "Nas próximas semanas, o comportamento da epidemia vai ser definitivo para que as projeções se tornem confiáveis."


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