São Paulo, segunda-feira, 12 de abril de 2004

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Especialistas dizem que há avaliação nesse sistema; apenas em MG e em SP, a maioria das escolas segue o método

Crítica de Lula reacende debate sobre ciclos

ANTÔNIO GOIS
DA SUCURSAL DO RIO

As críticas do presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao sistema de ciclos, feitas em dois pronunciamentos no início deste mês, reacenderam o debate que tende a culpar o método pela falta de qualidade da educação brasileira.
Nos ciclos, ao contrário do que acontece no sistema seriado, o aluno tem a chance de continuar na mesma turma por um determinado período mesmo que suas notas não sejam suficientes para que passe de ano. O objetivo é permitir que o estudante tenha mais tempo para aprender, em vez de ficar retido na mesma série.
O sistema de ciclos não é um método unânime entre educadores, mas especialistas ouvidos pela Folha afirmam que o presidente pode ter cometido equívocos ao fazer as críticas.
No dia 1º de abril, ao inaugurar uma fábrica em Araras (SP), Lula afirmou que "neste país, num determinado momento, foi decidido que o aluno não iria mais repetir de ano e que o seu ano seria ano contínuo, sem nenhuma prova". Disse também que "hoje, constata-se que 52% das crianças que saem da escola ou que estão na 5ª série não conseguem interpretar um texto porque não estão tendo a formação correta".
Na verdade, nunca houve uma decisão federal obrigando Estados e municípios a adotarem o sistema de ciclos. A LDB (Lei de Diretrizes e Bases da Educação), aprovada em 1996, apenas facultou aos Estados adotar o sistema.
As estatísticas do Ministério da Educação mostram também que os ciclos não podem ser responsabilizados pela falta de qualidade na educação brasileira. Em 2002, segundo dados do Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira), do MEC, apenas 21% dos estudantes do ensino fundamental estudavam em escolas que adotavam exclusivamente sistema de ciclos.
Das 27 unidades da federação, só duas (São Paulo e Minas Gerais) têm mais da metade dos alunos em escolas que adotam exclusivamente ciclos. Em 22 Estados, esse percentual não chega a 10%.
A professora da PUC-RJ Cláudia Fernandes, que fez sua tese de doutorado a respeito dos ciclos, aponta outro equívoco na fala do presidente: "É um erro dizer que não há prova ou que alunos não são avaliados. Num sistema de ciclos, devem existir ainda mais avaliações, mas elas não têm o propósito único de determinar se o aluno será reprovado ou não".
Fátima Baierle, secretária da Educação de Porto Alegre, onde a gestão do PT defende os ciclos, concorda que, no sistema, a avaliação é ainda mais importante.
"O objetivo da avaliação é garantir a aprendizagem. Fazemos uma avaliação diagnóstica, mais profunda do que normalmente acontece numa escola seriada."
Após as críticas em Araras, Lula voltou a falar sobre o assunto em Três Lagoas (MS), na inauguração de uma termelétrica em 2 de abril: "Não é possível uma criança entrar na escola e ter aprovação continuada porque o índice de repetência é alto demais".
Nesse ponto, João Batista Araújo e Oliveira, consultor da área de educação e ex-secretário executivo do Ministério da Educação, concorda com o presidente.
"Num país como o Brasil, a idéia de ciclos associada à suspensão da reprovação é irresponsável." Para Oliveira, uma das maneiras de combater o problema da repetência sem necessidade de sistema de ciclos é reformular o método de alfabetização de crianças, que, na sua avaliação, está ultrapassado no Brasil e prejudica o desempenho dos alunos em todas as disciplinas.


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