São Paulo, terça-feira, 12 de julho de 2005

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CRIME ORGANIZADO

Escutas revelam que facções criminosas planejaram se infiltrar em órgãos públicos para ter acesso a dados sigilosos

PCC tentou fraudar concurso para policial

MARIO HUGO MONKEN
DA SUCURSAL DO RIO

Gravações de conversas telefônicas feitas pela Polícia Civil do Distrito Federal revelam que, com a ajuda de integrantes de uma quadrilha que fraudava concursos públicos no país, as facções criminosas PCC (Primeiro Comando da Capital) e CV (Comando Vermelho) planejaram infiltrar representantes em órgãos policiais e da Justiça para ter acesso a dados privilegiados e sigilosos.
Responsável pela investigação, o delegado Celso Ferro, da Delepat (Delegacias de Repressão a Crimes contra o Patrimônio), confirmou à Folha que há gravações que mostram conversas do suposto líder da máfia dos concursos, o advogado e serventuário da Justiça brasiliense Hélio Garcia Ortiz, com integrantes das duas facções presos em penitenciárias do Rio e de São Paulo.
Os contatos teriam começado há cerca de seis meses, segundo Ferro. Preso em maio, Ortiz foi solto no mês seguinte beneficiado por um habeas corpus.
Ortiz, de acordo com a polícia brasiliense, teria negociado com líderes do CV e do PCC, dentre outros crimes, a facilitação para que seus representantes fossem aprovados em concursos públicos. Entre as seleções que a quadrilha foi acusada de fraudar estão as de delegado da PF (Polícia Federal) e a de agente penitenciário federal.

Todos soltos
A quadrilha da máfia dos concursos foi desbaratada em maio deste ano, quando a Justiça do DF autorizou a prisão de 92 pessoas envolvidas. Entre os presos estavam policiais e funcionários do Tribunal de Justiça. Como houve mudança de competência para a Justiça Federal, todos acabaram soltos em junho.
O grupo é acusado de ter atuado desde 1981 fraudando concursos e vestibulares em vários Estados. Mediante pagamento dos candidatos, Ortiz lhes forneceria o gabarito da prova e o tema da redação alguns dias antes do exame.
Ele também inscreveria professores ou pessoas treinadas nos concursos para que fizessem as provas. Elas saíam rapidamente da sala do exame e, por meio eletrônico, passavam a resposta aos outros candidatos.
Como os supostos integrantes da quadrilha estão soltos, Ferro afirmou não poder revelar o conteúdo das gravações. "Temos informações de que o grupo continuaria atuando", disse.
Por isso, o delegado não informou com quem do PCC e do CV a quadrilha manteve contatos. A polícia não divulgou também se o grupo liderado por Ortiz já teria colocado representantes das facções em órgãos públicos.

Estratégia
Os encarregados da investigação declararam que o elo entre a máfia dos concursos e as organizações criminosas do tráfico de drogas é uma mudança de estratégia do crime organizado para ter acesso a informações privilegiadas dos órgãos oficiais.
Em vez de tentar subornar funcionários públicos e policiais, os traficantes estariam tentando colocar representantes dentro do serviço público ou estariam pagando cursos preparatórios para que pessoas ligadas a eles tenham condições de passar em concursos públicos.
Ferro afirmou que o grupo de Ortiz também articulou com o PCC e o CV crimes como desvio de mercadorias contrabandeadas e quebra de alienação de veículos.


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