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DANUZA LEÃO
Os direitos do homem
Evite sofrer; ao menor sinal de que vai começar a tortura, pense em primeiríssimo lugar no que você quer
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TODOS TEMOS diariamente,
sempre, um monte de compromissos, sejam eles de um
trabalho que se ficou de entregar até
o final da semana, ao médico marcado, à ginástica. Tirando alguns deles,
é preciso aprender, desde cedo, que
não somos obrigados a quase nada, e
até o filme que tanto queremos ver
pode esperar até chegar no clube de
vídeo ou passar na TV. Afinal, somos
escravos de uma agenda ou pessoas
livres?
É difícil ter consciência disso. Até
os compromissos que assumimos
com nós mesmos são dificílimos de
serem cancelados, pois afinal -como aprendemos- compromisso é
compromisso.
Exemplo: você se programou para
viajar no fim do ano e sair fora do estresse das festas, de ouvir e ter que
dizer Feliz Natal 500 vezes, para ficar só numa praia deserta olhando o
mar e comendo peixe frito. Tudo
bem, é seu direito. Mas lá pelo fim de
novembro vai dando uma agonia; e
se chover? E se o lugar indicado não
for tão sensacional quanto dizem? E
se cair em depressão? E o medo de
se sentir tão só, mas tão só, que corre
o risco de cair em prantos no ombro
do primeiro desconhecido que aparecer? Começa a se sentir mal, mas a
última coisa que passa pela sua cabeça é mudar os planos e cancelar a
viagem, já que assumiu o compromisso de ir. Já pensou que bastaria
um telefonema, um só, para resolver
o problema?
Outra situação clássica é estar no
melhor lugar do mundo, comendo
as coisas mais deliciosas, comprando o que queria, e dar uma vontade
louca de voltar antes da data prevista; e a coragem? Agora me diga: coragem de quê? Afinal, você é ou não é livre para ir e voltar de onde quiser,
na hora em que quiser? Isso não faz
parte do seu sagrado direito à sua
própria vida? Seja corajosa; afinal,
está com medo de quê?
Agora uma coisa mais banal ainda:
está fazendo frio, você acordou mais
tarde do que de costume e tem ginástica às 4h. Ginástica, para você, é
sagrada, pois é uma questão de saúde, de bem-estar, e todos temos a
obrigação de nos cuidar; mas naquele dia não está dando, e você começa
a sofrer. Sofrer porque não passa por
sua cabeça que pode perfeitamente
cancelar a ginástica e ficar vendo um
filme, mesmo idiota, na televisão.
Afinal, não estamos no exército, e
talvez esta tarde passada em casa,
com os gatinhos deitados no mesmo
sofá com você, te faça mais bem à alma do que um ano de exercícios físicos. À alma, não ao corpo, mas nesse dia faça o que seu coração pedir. E
prepare-se para passar um dia muito feliz, pois gazetear uma aula de ginástica é das coisas melhores do
mundo.
E aquele jantar que parecia ser tão
interessante? Muitos amigos, também gente desconhecida, até já tinha escolhido como ia vestida. Mas
lá pelas 5h, 6h da tarde, pensa que só
quer uma coisa na vida: ficar em casa
sozinha, sem ter que conversar com
ninguém, lendo um livro, o que não
faz há muito tempo. Mas estão contando com você, que jurou que ia.
Começa o sofrimento entre o compromisso e a vontade: faz o quê? Pois
não vá; simplesmente não vá, e talvez nem faça falta. Afinal, sua presença não é assim tão fundamental,
e uma dor de coluna é fácil de inventar e não faz mal a ninguém.
E evite sofrer; ao menor sinal de
que vai começar a tortura, pense em
primeiríssimo lugar no que você
quer, e siga o seu coração, sem culpas nem arrependimentos, porque
esse é um dos maiores direitos do
homem.
E eu vou seguir meus próprios
conselhos e já já desmarcar minha
ginástica de hoje.
danuza.leao@uol.com.br
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