São Paulo, domingo, 12 de agosto de 2007

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Filhos criam e desmontam suas versões sobre os pais

A construção e a desconstrução da figura paterna passa pelo olhar dos rebentos

De modelo a espelho, de super-herói a oponente, as descrições de pai mudam ao longo da vida, de acordo com o relato dos filhos

ROBERTO DE OLIVEIRA
DA REVISTA DA FOLHA

Para pensar durante o almoço de hoje: se tivesse de descrever seu pai ao longo da vida, quantas versões ele teria?
Na infância, costumamos pintá-los com cores e poderes de super-herói.
Com as primeiras espinhas, vêm também as primeiras discussões. A admiração incondicional cede lugar ao confronto -de idéias, gostos, objetivos.
Autonomia financeira conquistada, a jornada segue sem a diligência do pai. A ânsia pela independência que acompanhou as espinhas se transforma em saudade, mas o turbilhão da vida adulta lhe toma até o tempo de sentir -por vezes, até de telefonar.
Ainda que relute, chega o dia em que alguém te chama de pai. E então o mundo muda, você muda e, de repente, ele também mudou. De modelo passou a espelho, e você se vê repetindo com os seus o que ele fazia quando te chamava de meu.
É esse convívio em etapas, sempre em construção, que determina os diferentes laços que se estabelecem entre pais e filhos durante a vida, dizem os especialistas. "Quando chega à paternidade, o filho tem de estar em paz com os conflitos que teve com o pai para exercê-la bem", diz Jonia Lacerda, 48, psicóloga supervisora do Instituto de Psiquiatria da USP.
Não importa como se exerça essa "profissão", ela sempre terá os resquícios impressos pelo progenitor. "Os filhos reproduzem a figura paterna tanto para o lado positivo como para o negativo", diz a terapeuta Magdalena Ramos, 68, professora do Núcleo de Casal e Família da PUC-SP. Para ela, filhos repetem padrões de comportamento muito mais do que discursos. Quanto mais etapas se completam mais lembranças se acumulam. E nem sempre elas são doces. Uma surra ou uma discussão podem deixar o mesmo tipo doloroso de ferida. Que, às vezes, cicatriza em demasia, a ponto de endurecer. Nessa hora pode-se aplicar a doutrina do livre arbítrio, e, se possível, escolher que parte da história (e do pai) se quer perpetuar.
"Como dizia Jacques Lacan, é necessário servir-se do pai para poder prescindir dele", lembra o psiquiatra e psicanalista Ariel Bogochvol, 49, da USP. "O pai é uma referência necessária, um elemento simbólico que ao mesmo tempo constrói valores como herança. Para que o filho crie sua própria autoria."

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