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SEM PÁTRIA
Dupla enfrenta drama após condenação; Itamaraty nega documento por não acreditar em readaptação
EUA querem deportar brasileiro adotado
MARCIO AITH
enviado especial a Medina, Ohio
Joao Herbert e Djavan Arams
Silva foram adotados legalmente
por casais norte-americanos em
1986 e 1987, quando tinham 7 e 10
anos e moravam em orfanatos na
cidade de São Paulo.
Eles viveram durante 13 e 14
anos com seus pais adotivos, nos
Estados de Ohio e de Massachusetts. Estudaram em escolas norte-americanas, foram aceitos pela
comunidade de suas cidades e
perderam todos os vínculos com
o Brasil -inclusive com a língua
portuguesa, que não falam nem
entendem.
Julgavam-se norte-americanos.
Até que violaram a lei e foram
condenados por tráfico de drogas
(em 1996, Joao -assim, sem o
til- tentou vender uma pequena
quantidade de maconha a um conhecido) e desacato à autoridade
e agressão a um policial (Djavan
resistiu a uma batida policial,
também em 1996).
Enquanto cumpriam suas penas há dois anos, os dois foram
avisados pelo governo dos EUA
de que seriam deportados para o
Brasil assim que suas condenações fossem cumpridas.
O serviço de imigração dos EUA
afirma que ambos são brasileiros,
apesar de adotados legalmente
por pais norte-americanos, e que
devem ser expulsos do país assim
que pagarem sua dívida com a sociedade.
Os EUA justificam sua decisão
com base em duas leis altamente
controversas. A primeira, que
cuida de adoções no país, só garante cidadania a crianças que forem naturalizadas pelos pais. Os
EUA são o único país no mundo
desenvolvido onde isso ocorre.
A outra lei foi aprovada em
1996, após o atentado que destruiu um prédio federal em Oklahoma. Ela determina que os estrangeiros condenados por qualquer crime sejam deportados depois que cumprirem pena.
Não há recurso contra a decisão
de deportá-los e a lei não abre exceções para crianças estrangeiras
adotadas por famílias norte-americanas.
No mês passado, o serviço de
imigração dos EUA pediu ao governo brasileiro os documentos
de viagem necessários para que
ambos fossem deportados.
Por orientação formal do Itamaraty em Brasília, o governo
brasileiro negou o pedido, alegando que a adoção é um ato irrevogável. O Itamaraty alega ainda
que os dois jovens não têm mais
as mínimas condições de adaptarem-se ao país onde nasceram e
de onde foram tirados há mais de
uma década por casais que prometeram à Justiça brasileira que
os tratariam como filhos.
Diante da resistência brasileira
em cooperar com os EUA, o serviço de imigração dos EUA em Cleveland, que cuida do caso de Herbert, diz que, sem os documentos
necessários para a deportação, ele
ficará preso indefinidamente, até
que um terceiro país o aceite.
"Não há outra solução", disse à
Folha Mark Hansen, responsável
pela diretoria do serviço de imigração na região onde Herbert está preso, na pequena cidade de
Medina (100 km de Cleveland).
De dentro de seu uniforme escuro, fornecido aos presos estrangeiros e aos mais perigosos, Joao
Herbert diz não entender o que
está ocorrendo.
"É como se eu não tivesse país,
como se não pertencesse a lugar
nenhum", disse ele à Folha. "Nasci brasileiro, me transformei em
americano e querem que vire brasileiro de novo. Por mais que me
dêem tempo de graça para pensar
aqui na cadeia, não consigo entender. Aliás, não consigo mais
aguentar, já paguei pelo crime
que cometi."
Nenhum dos pais adotivos dos
dois jovens os haviam naturalizado. Eles alegam falta de informação e argumentam (equivocadamente) que seus filhos adotivos
perderiam a nacionalidade brasileira se assim o fizessem.
"Eu queria que meu filho, quando crescesse, optasse por sua própria nacionalidade. É por essa razão que não dei entrada nos papéis", diz Jim Herbert, pai de Joao
que o visita quase que diariamente na cadeia. "Ele é meu filho e eu
o quero comigo."
Jim esteve errado durante todos
esses anos, mas só descobriu agora. Depois do caso de Joao, deu
início ao processo de naturalização de seu outro filho adotado no
Brasil, Daniel Herbert.
O caso de Silva é formalmente
igual ao de Herbert, mas sua situação é mais dramática. Seus
pais adotivos não o visitam e não
querem mais se relacionar com
ele. Um diplomata brasileiro informou que Silva precisa de ajuda
psicológica. Preso numa penitenciária na Pensilvânia, ele sofre de
forte depressão.
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