São Paulo, terça-feira, 13 de fevereiro de 2007

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

"Governo está acéfalo", afirma comandante a passageiros da Gol

IGOR GIELOW
SECRETÁRIO DE REDAÇÃO
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

"Estou aqui dividindo minha indignação." "As autoridades competentes não fazem nada." "O governo está acéfalo."
Uau. Mesmo para os passageiros do vôo 1743 da Gol, que já exibiam o cansaço conformado que se tornou praxe no país do apagão aéreo, as frases proferidas em tom solene pelo "comandante Ângelo" causaram uma certa surpresa.
"Ele disse isso mesmo?", perguntaram-se entre si passageiros nas últimas fileiras do Boeing-737/800 que deveria ter decolado mais de uma hora antes na noite de anteontem.
Eram 21h15, e o vôo entre Congonhas e Macapá, com escalas em Brasília e Belém, tinha a saída prevista para as 20h05. Os passageiros só foram embarcados às 20h40, e esperaram uma hora dentro do avião.
A crise aérea brasileira, que já evidenciou falhas monumentais no controle de vôos, no planejamento das empresas e na capacidade de gerenciamento do trio FAB-Infraero-Anac, agora evidencia uma nova personagem: o piloto que deita no divã do cockpit e reproduz o discurso das companhias de que a culpa toda é do "grande outro" -no caso, a FAB.
Só que para que o passageiro possa cumprir seu papel de analista e não seja contaminado pela inevitável simbiose com seu analisado, é importante qualificar esse discurso. Até porque controladores e autoridades aeronáuticas culpam as empresas e sua expansão por todos os males da crise.
"Estamos querendo saber, assim como as outras aeronaves aqui, qual é nossa posição no seqüenciamento", disse o comandante, com a bizarra naturalidade que meses de noticiário permitem: hoje quase todo passageiro de avião está algo familiarizado com o jargão do setor aéreo. Ele falava da ordem das decolagens.
O comandante explicou que seu pouso havia demorado porque o 737/800 que pilotava é um dos modelos que tem restrição para pouso sob chuva em Congonhas. Mas no domingo Congonhas só foi interditado para medição da lâmina d'água na pista às 18h, por 10 minutos. A pista estava liberada às 20h20, horário aproximado do pouso do Boeing.
Outro ponto que o discurso do comandante não elucidou: ele queixou-se de que não sabia qual seu lugar na fila de decolagens, mas a Gol (como todas as empresas) tem um representante no Centro de Gerenciamento do aeroporto. Em tese, teria como saber.
Procurada, a assessoria da Gol disse que a empresa não orienta seus pilotos a se queixarem e que manifestações como essas são "espontâneas".
Essa espontaneidade vem se proliferando. Em janeiro um relatório da FAB mostrou que um piloto da TAM falava sobre os perigos de pousar aviões no Brasil. Em 28 de janeiro, o piloto do vôo TAM 3324, de Guarulhos a Fortaleza, disse que "os caras [os controladores] realmente não querem trabalhar".
Como nove entre dez gestores do sistema fazem críticas às empresas, fica difícil para o cliente saber quem está com a razão. E, para isso, não há psicanálise que resolva.


Texto Anterior: Carnaval faz Congonhas operar na madrugada
Próximo Texto: Comemoração para os calouros do Mackenzie fecha ruas em São Paulo
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.