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PASQUALE CIPRO NETO
Patacoada Futebol Clube
Nélson Rodrigues dizia
que o futebol é a coisa mais
importante das menos importantes. Concordo com ele. Sou doentiamente apaixonado pelo "esporte bretão". Deliciam-me os
dribles e passes de Cacá (por que
"Kaká"?), as mortais arrancadas
de Gil pela esquerda e as geniais
diabruras de Robinho e Diego.
Quando a coisa sai do campo de
jogo, a história muda -e muito.
Maracutaias à parte, o pessoal
que "dirige" o futebol brasileiro é
especialista em criar regulamentos burros. Sim, burros, porque
nenhum adjetivo pode definir
melhor essas patacoadas perpetradas por esses gênios.
Antes que me esqueça, vou avisando que esta coluna não fala de
esporte, não. Meu assunto é outro. O futebol será só pretexto para a análise de algo muito mais
importante: o raciocínio lógico, a
diferença entre o absoluto e o relativo, temas de que, por sinal, já
tratei algumas vezes neste espaço.
O leitor certamente sabe dos vários estudos publicados de tempos
em tempos a respeito da capacidade de leitura e compreensão de
textos, do raciocínio lógico e matemático, da percepção da realidade, da competência para relacionar dados e fatos etc.
O Enem (Exame Nacional do
Ensino Médio), por exemplo, avalia basicamente esses atributos.
Em uma de suas clássicas questões, a banca pediu aos candidatos que informassem quantas viagens seriam necessárias para que
três pessoas atravessassem um
rio. Os dados eram estes: havia só
um barco, que suportava até 150
kg. O passageiro mais magro pesava 50 kg; o mais gordo, 120 kg; o
intermediário, 70 kg.
Já pensou? De que disciplina é
essa questão? É de matemática?
De texto? Ou de tudo? É bom lembrar que o Enem não divide as
questões por matéria, já que o alvo da prova é a verificação das
várias habilidades (aquelas de
que falei no quarto parágrafo).
Vamos lá: na primeira viagem,
o gordinho não pode ir, certo? Se
ele for, ninguém mais vai; se for
sozinho, o barco não volta. Quem
vai primeiro? Os dois mais leves
(50 + 70 = 120; o barco suporta
150). Um fica (qualquer um) e outro volta. O que volta fica, para o
mais pesado atravessar o rio, sozinho. O que tinha ficado na primeira viagem retorna e apanha o
que voltou ao ponto de partida.
Moral da história: cinco viagens
para que os três atravessem o rio.
O que essa história tem que ver
com o futebol? Pois bem, estamos
em plena final do Campeonato
Paulista, e o assunto da semana é
a "vantagem". Quem joga por
"dois resultados iguais" (bobagem que muita gente adora perpetrar; se um time perde as duas
de 15 x 0 é campeão?)?
Lido e relido o regulamento, feitas as contas, chegou-se à conclusão de que a vantagem é do São
Paulo, porque "tem melhor campanha". Por acaso São Paulo e
Corinthians enfrentaram os mesmos adversários? Os pontos obtidos pelas duas equipes saíram do
mesmo universo? Não; os dois times sempre enfrentaram adversários distintos.
Moral da história: ninguém tem
melhor campanha, porque as
campanhas são diferentes. Em
outras palavras, não se pode tratar como relativo o que na verdade é absoluto. Se A ganha de B e
de C, enquanto X empata com Y e
Z, não se pode concluir que A é
melhor que X. Entendeu? É isso.
Pasquale Cipro Neto escreve nesta coluna às quintas-feiras
E-mail - inculta@uol.com.br
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