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"Não se acaba o terror com beijinhos"
LAURA CAPRIGLIONE
ENVIADA ESPECIAL AO RIO
O Rio turístico de Ipanema e
Copacabana, que acompanha pela TV e pelos jornais a ação dos
falcons armados de fuzis em morros da cidade, fala muito sobre a
ação militar. Em grande medida,
apóia-a. "O Exército tem de usar
os blindados para arrombar as
ruelas dos morros. Onde já se viu
um lugar onde a polícia não consegue entrar?", pergunta o estudante cearense de direito Alfredo
de Freitas, 23, radicado em Copacabana.
"Tomara que nunca encontrem
essas armas, para o Exército nunca sair dos morros", diz a prostituta Fernanda da Silva, autodefinida "negra e pobre, como os favelados", da Ilha do Governador,
que se oferecia aos turistas na avenida Atlântica, zona sul do Rio, na
semana passada.
O motorista de táxi D.F. desabafa: "Olha, não tinha mais jeito. A
cidade vive aterrorizada e a polícia do Rio, corrupta como é, não
consegue mais dar conta dessa
violência toda".
Na festinha familiar de aniversário na Tijuca, zona norte do Rio,
um brinde silencioso é feito à
ação. "Não se acaba com o terror
dos traficantes com beijinhos e
abraços. Sabe como é que se acabou com o seqüestro na cidade?
Com a polícia torturando para
obter informações e, depois, matando os bandidos. Sinto muito,
mas não tem mais conversa", diz
um convidado, militante histórico do PT. Detalhe: a festa contava
com vários "companheiros", que
faziam "sim" com a cabeça.
Nem contra nem a favor
E sobra indefinição, mesmo em
quem se esperaria opositor à ação
militar. O coronel reformado da
Polícia Militar, hoje secretário estadual de Direitos Humanos do
Rio, Jorge da Silva, por exemplo.
"Queria ver se condomínios de
classe média estivessem sendo sitiados, em vez dos morros", diz.
"Queria ver se o adolescente morto por tiro de fuzil, em vez de morador de morro, fosse de Ipanema." (Ele se refere ao jovem
Eduardo dos Santos, 16, morto
por tiro de fuzil -não se sabe se
do tráfico ou do Exército).
"Então o senhor é contra a ocupação dos morros?", perguntou a
Folha ao secretário. "Não ponha
que sou contra, não."
Convidado a subir o morro da
Providência, vizinho da secretaria, para ouvir os moradores, o secretário declinou: "Agora não
posso. Vou dar entrevista sobre
agressões a homossexuais". E depois, secretário? "Fica para a semana que vem."
O antropólogo Rubem Cesar
Fernandes, da ONG Viva Rio, que
encarnou a oposição mais renhida à comercialização de armas de
fogo, no referendo sobre o desarmamento, agora não é contra
nem a favor da ação do Exército.
"Eu já me ferrei muito com esse
negócio de sim ou não", disse Fernandes, lembrando da derrota no
referendo. Segundo ele, "deveria
ter havido mais controle sobre os
arsenais do Exército, em vez de
tanta pirotecnia. De todo modo, a
situação da cidade é tão grave, que
a ação militar fica até justificável."
A secretária de uma ONG "defensora da favela", o Afro Reggae,
assim justificou que a entidade
não se posicione em relação à
ação militar: "Nós mediamos
conflitos. Não poderemos mediar
se opinarmos".
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