|
Próximo Texto | Índice
RIO SOB TENSÃO
Sob ataque de traficantes, comandante da PM teve de se refugiar; mais dois supostos criminosos foram mortos e 16 foram presos
1.300 policiais não asseguram paz à Rocinha
MARIO HUGO MONKEN
DA SUCURSAL DO RIO
A favela da Rocinha (zona sul do
Rio) foi ocupada ontem por cerca
de 1.300 policiais civis e militares,
numa das maiores operações já
realizadas pela polícia do Rio.
Dois supostos traficantes foram
mortos, aumentando para dez o
número de mortes na região desde a madrugada de sexta-feira.
Um outro suspeito de integrar o
tráfico ficou ferido.
A operação, chefiada pelo próprio comandante-geral da Polícia
Militar, Renato Hottz, não intimidou os traficantes, que, escondidos no alto da favela, reagiram a
tiros. De manhã, Hottz coordenava uma equipe de policiais na localidade conhecida como Curva
do S quando os criminosos soltaram fogos e fizeram disparos. Ele
se refugiou atrás de uma caçamba
de lixo para não ser atingido.
Os traficantes também impediram a polícia de socorrer uma
mulher em trabalho de parto. Os
policiais tiveram que chamar uma
ambulância do Corpo de Bombeiros, que realizou o parto na rua.
Segundo a Secretaria de Segurança Pública, 16 supostos traficantes foram presos na operação
de ontem na Rocinha e 28 armas
foram apreendidas (entre elas três
fuzis e duas granadas). Quinze
veículos roubados foram recuperados. Nenhum dos presos integraria a cúpula do tráfico.
A ação foi desencadeada para
impedir que a guerra entre traficantes rivais da Rocinha fizesse
mais vítimas. Na madrugada de
sexta-feira, uma tentativa de invasão à favela a partir do vizinho
morro do Vidigal deixou dois
moradores mortos. Na mesma
noite, num bloqueio de traficantes na avenida Niemeyer, próxima ao Vidigal, uma mulher foi
morta com um tiro na cabeça por
não obedecer à ordem de parar.
A polícia acredita que atuem na
Rocinha cerca de 200 traficantes
ligados a Luciano Barbosa da Silva, o Lulu, que controla os pontos-de-venda de drogas na favela.
O comandante do 23º Batalhão
(Leblon, zona sul), tenente-coronel Jorge Braga, disse ter recebido
informações de que pelo menos
dez traficantes ligados a Eduíno
Eustáquio de Araújo Filho, o Dudu, rival de Lulu e líder da tentativa de invasão, ainda estariam escondidos na Rocinha.
Apesar de a favela estar ocupada
por tempo indeterminado, Hottz
disse não descartar a hipótese de
novos confrontos ocorrerem nas
próximas horas. Ele não quis comentar o episódio em que teria sido alvo de tiros.
"Você é contra a polícia, sempre
assume uma postura crítica contra a polícia, com você não tem
mais papo", disse Hottz ao repórter da Folha.
Durante todo o dia, os policiais
que ocuparam a Rocinha revistaram casas e moradores, além de
carros e ônibus que entravam na
comunidade, onde moram, segundo o Censo 2000, 56 mil pessoas. Eles circulavam expondo
seus fuzis e pistolas. Os policiais
também vasculharam a mata que
separa o Vidigal da Rocinha, à
procura de traficantes, mas ninguém foi encontrado.
Por volta do meio-dia, um grupo de PMs foi recebido a tiros por
um traficante que estava escondido em uma casa na favela. Os policiais revidaram e o homem, conhecido apenas como Maurinho,
foi morto com um tiro no peito.
O corpo foi retirado da favela
dentro de um carrinho de mão.
Os policiais circularam com o cadáver pela rua do Valão, uma das
mais movimentadas da Rocinha.
Outros dois supostos traficantes
foram baleados em outro tiroteio
em um diferente ponto da Rocinha. Um deles morreu.
Ameaça a jornalistas
O clima ficou tenso também para os jornalistas que estavam na
favela. No início da manhã, foram
captadas, por meio de radiotransmissores, ameaças de traficantes
aos repórteres e fotógrafos. Em
um dos trechos captados, os traficantes diziam: "Vamos meter bala nos repórteres".
Um dos presos ontem foi identificado como Marcelo de Souza,
30. Sua mãe, Maria Rozilda da Silva, 35, se desesperou com a prisão. "Meu filho acabou de sair da
prisão e estava desempregado, fazendo alguns biscates", disse.
Antes da operação na Rocinha,
uma das maior ações da polícia
do Rio ocorreu em setembro de
2002, no complexo de favelas do
Alemão (zona norte do Rio). Cerca de mil dos 50 mil policiais da cidade foram mobilizados para a
prisão do traficante Elias Pereira
da Silva, o Elias Maluco, acusado
do assassinato do jornalista Tim
Lopes.
Das dez pessoas mortas na Rocinha desde sexta-feira, três eram
moradores da favela, atingidos
por balas perdidas. Os outros foram dois policiais, quatro supostos traficantes e a mineira Telma
Veloso, 38, morta na avenida Niemeyer. Desde sexta-feira, 25 supostos traficantes foram presos.
O inspetor Marco Antônio Rúbia, da DRFA (Delegacia de Roubos e Furtos de Automóveis), que
participou de operação na Rocinha no domingo, disse que ficou
surpreso com a boa recepção dos
moradores, que chegaram a oferecer café aos policiais civis.
Há dois meses, policiais militares foram acusados por moradores de matar na Rocinha dois adolescentes que não teriam relação
com o tráfico de drogas.
Próximo Texto: "Bocas" movimentam R$ 50 mi/mês Índice
|