São Paulo, sábado, 13 de maio de 2006

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LETRAS JURÍDICAS

Ellen Gracie na busca do Judiciário eficiente

WALTER CENEVIVA
COLUNISTA DA FOLHA

A presidente do STF, ministra Ellen Gracie, teve manifestação digna de aplauso no seu discurso de posse, a ser cobrada dela e de todos os líderes de tribunais, quando disse que a "compreensão de um sistema judiciário eficiente e operante tem como ponto central o acesso mais amplo ao serviço público essencial que é a Justiça". Ela, mais do que outros, sabe, pois tem a missão precípua de guarda da Constituição, que a Carta Magna exige eficiência dos serviços públicos.
Para chegar a esse objetivo, manifestou quatro posições que a classe jurídica também defende: a) a difusão e o fortalecimento dos juízos de primeiro grau devem ser priorizados; b) todos os cidadãos devem ter "acesso fácil a um juiz que lhes dê resposta pronta", como ideal a ser buscado; c) a avaliação do mérito das questões discutidas não pode ser atrapalhada pelo formalismo ou pelo uso de manobras que adiam a decisão final; d) a sentença deve ser "compreensível a quem apresentou a demanda" e se enderece "às partes em litígio, com caráter esclarecedor e didático".
Em síntese: mais juízes, mais rapidez, menor número de jogadas processuais para a arquibancada e mais gols do direito material realizado. Se Ellen Gracie cumprir apenas essa parte de seu projeto inaugural, já terá feito belo trabalho. No juízo de primeiro grau, nas comarcas próximas ou distantes, pequenas ou grandes em população ou extensão, o magistrado na vara é o único a combater diretamente na trincheira do povo, cara a cara com a sociedade. Nos tribunais, a distância, em face dos advogados, é mantida, sob desculpa de que a conversa pessoal é perda de tempo. Não é. O advogado fala em nome do cliente, de quem busca a Justiça oficial. Um dos preços pagos pela magistratura à sociedade é o de ouvir as partes ou seus representantes.
A sinceridade transparente nas palavras da primeira mulher a presidir um tribunal superior do Brasil encontrará limites nos obstáculos da burocracia dos que recusam a eficiência. Dos que não compreendem, nas palavras dela, que o destinatário do trabalho do juiz é "o cidadão jurisdicionado, não as academias jurídicas, as publicações especializadas ou as instâncias superiores". Nem sempre o magistrado mostra plena consciência de que é pago com os tributos que nós todos, os cidadãos, temos de recolher. Cada um de nós tem o direito de cobrar do magistrado; e do Estado, a prestação da Justiça. Nada deve ser mais claro e acessível do que uma decisão judicial rápida e bem fundamentada, disse a ministra Ellen Gracie.
A presidente do STF foi além quando discutiu o assunto da linguagem complicada nas sentenças. Ellen Gracie ao referir, em seu discurso de posse, a questão, pôs fé na clareza necessária da sentença e, "sempre que possível, líquida", isto é, que já indique o valor a ser cobrado ao perdedor. Quando o juiz silencia a respeito, está fazendo o jogo da parte contrária, "sacrificando a dignidade do Poder que representa". Há ações em que o particular enfrenta órgãos como o DNER, o INSS, a CEF, na esfera federal, o Estado e a Prefeitura de São Paulo, nas quais protelação só é possível graças ao poder Judiciário. O discurso de Ellen Gracie merecerá outros comentários, mas só as considerações hoje examinadas já caracterizam sua posição como exemplarmente bem definidas.


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