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Notívago de SP adota o "quanto mais trash melhor"
Modernos saem em busca de lugar fora do "circuito descolado" da cidade
Locais como um videokê na Liberdade e um botequim tradicional da rua Augusta atraem quem opta por não recorrer aos clubes em alta
NINA LEMOS
COLUNISTA DA FOLHA
"Eu só frequento lugar trash,
graças a Deus." Assim a estilista
Karla Girotto, 30, define sua
preferência por programas noturnos que não estão nos guias
de baladas nem fazem parte do
circuito ""descolado oficial" da
cidade. Karla faz parte de uma
turma que, de tão vanguardista,
rejeita os lugares feitos para
pessoas que aparecem em sites
e revistas para "modernos" como ela e preferem descobrir
um karaokê tradicional em que
nunca "ninguém foi" ou adotar
um novo botequim.
A mania, claro, transforma
lugares de São Paulo antes freqüentados por quem mora perto em templo ""radical chique".
São Paulo ganhou dois clubes
neste ano, o Glória, no Bexiga, e
o Royal, no centro. Ao mesmo
tempo, o Vegas, no coração underground da rua Augusta,
completou um ano de sucesso.
Mesmo assim, o sucesso das
casas foi abafado, nas conversas
dos notívagos de São Paulo, pela pergunta: ""Como assim, você
nunca foi no "Karaokê da Mamma?"". Trata-se da Choperia Liberdade, um karaokê tradicional na rua da Glória. Mamma é
a gerente, que viu a casa, aberta
há três anos, em poucos meses
ser invadida por pessoas com
roupas esquisitas, tênis All Star
e cabelos desarrumadinhos.
""É muito mais legal vir aqui,
que é um lugar trash de verdade, do que em um lugar que
imita um lugar kitsch", diz
Frank Dezeuxis, 32, diretor de
arte e assíduo do lugar, onde
canta com os amigos músicas
bregas. "Acho que uma hora a
gente cansa de saber que música o DJ está tocando, de ter que
fazer tipo. O bom daqui é que a
gente pode cantar música brega. É Bruno e Marrone, não é
Tiga", diz, referindo-se a um
badalado DJ de electro.
Hoje, publicitários, integrantes de bandas de rock, moderninhos da MTV, estilistas e personalidades da noite, como o
ator Paulo Cezar Pereio, se misturam com os freqüentadores
habitues do karaokê, em geral,
moradores da Liberdade que se
habituaram ao programa quando ainda eram crianças.
Em uma das visitas da Folha
ao local, uma das mesas era
ocupada pela artista plástica
Tereza Berlinsck, que levou
amigos artistas estrangeiros direto de uma festa badalada para a ""Mamma". ""Aqui é o lugar
mais legal para trazer alguém
de fora. É legal em todos os aspectos", dizia Tereza, que já tinha ido até lá uma vez, mas
lembrou do lugar ""porque ouviu o pessoal comentar na Galeria Vermelho" (templo de artistas modernos em São Paulo)
sobre o tal lugar. Não por acaso,
no mesmo dia, um grupo de artistas da tal galeria ocupava
uma das mesas de sinuca. Ao
lado, um grupo animado reunia
freqüentadores do Vegas e do
The Edge. ""A gente gosta de
clube também, mas uma hora
isso cansa e a gente quer ver
uma coisa diferente e ficar
mais a vontade. Aqui é relax.
Não tem função noite, aquela
coisa de ter que pagar cartão de
consumação", diz Eloir Santos,
28, visual merchandising, morador de Pinheiros.
Karla Girotto, freqüentadora
assídua, teoriza. ""Gosto de sair
para fazer antropologia, não
para encontrar só gente igual a
mim. Não vou sair para ficar
mordendo meu próprio rabo.
Gosto de onde tem gente mais
esquisita do que eu. Não vou
servir de decoração de clube."
O gosto pelo trash faz também com que ela, claro, prefira
um bom botequim a um bar
cool. Seu preferido, no momento, é o Papo, Pinga e Petiscos, na praça Roosevelt.
O gosto pelos lugares ""lado
escuro da vida" transformou
um tradicional botequim da
rua Augusta, o Ibotirama, em
reduto cult. Tão badalado que
já anda cansando quem gosta
de um lugar onde realmente
""ninguém vá".
""Eu adoro, ia muito. Agora
acho que tem gente conhecida
demais. Daqui a pouco vou ter
que começar a me arrumar para freqüentar o Ibotirama", diz
Milena Carlstrom, 28, vendedora. Milena tem preferido freqüentar a sinuca que fica ao lado do bar. Trata-se de uma sobreloja difícil de encontrar,
com a porta fechada pela metade por uma banca de jornal.
A moça também descobriu
um videokê incrível na Consolação, o Belas Artes, um botequim pé sujo. O lugar é badalado por seu um videokê GLS.
""Adoro a mistura que está começando a acontecer aqui", diz
o garçom do bar, que prefere
ser chamado de garçonete.
Até os sérios freqüentadores
do karaokê da Liberdade vêem
com bons olhos a ""invasão moderna". ""Tem muita gente diferente freqüentando, mas tudo
bem, desde que entendam que
para nós isso é uma tradição séria e continuem respeitando",
diz um freqüentador.
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