São Paulo, quinta-feira, 13 de agosto de 2009

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Minha vida virou um inferno

Fumante, passageiro de ônibus fretado e corintiano, Marcelo, 27, conta que tudo mudou em sua vida nas últimas semanas; "só falta agora eu pegar gripe suína", diz

Letícia Moreira/Folha Imagem
Marcelo é fumante, passageiro de fretado e corintiano

VINÍCIUS QUEIROZ GALVÃO
DA REPORTAGEM LOCAL

O analista de sistemas Marcelo Taboada não acredita muito em inferno astral, mas nas últimas semanas viu a vida virar de pernas para o ar. Fumante, passageiro de ônibus fretado, e de quebra corintiano, diz que anda comendo o pão que o diabo amassou.
O calvário começou em 27 de julho passado, quando a prefeitura paulistana proibiu a circulação dos coletivos em boa parte do centro expandido. Poucos dias depois, em 7 de agosto, entrou em vigor a lei antifumo, que o obriga, em todo lugar que vai, a fumar na calçada.
E nesse intervalo, o Corinthians está há cinco jogos seguidos sem ganhar, perdendo do Palmeiras, do Náutico, do Flamengo... Bom, mas disso ele não quer mais falar.
"Está mudando tudo na minha vida. Não posso mais fumar, não posso andar de fretado, não posso dirigir depois de beber um copinho e ainda por cima o Corinthians perdendo. Só falta agora pegar a gripe suína", desabafa enquanto espera o fretado na estação Sumaré, depois daquele arranca-cabelo no metrô no pico das 18h.

Implicância
Rodeado de não fumantes implicantes que faziam cara de quem havia acabado de bater um prato de jiló, Marcelo, o corintiano sofredor, diz, fumando o último cigarro antes de subir no ônibus fretado, que tem agora de pagar R$ 100 a mais pelos bilhetes de metrô, além dos R$ 365 da condução particular.
Antes, o ônibus fretado que o leva a Jundiaí, onde mora, parava na alameda Jaú, a poucas quadras do prédio comercial em que trabalha na avenida Paulista. Agora, tem de andar até uma estação para tomar o metrô e descer no novo ponto de embarque que, depois da proibição da prefeitura, passou a ser no bolsão da Sumaré.
A mudança de rotina obriga Marcelo a perder horas de sono -tem de acordar mais cedo, para não chegar atrasado ao serviço, e o faz chegar ao menos meia hora mais tarde em casa depois do dia de trabalho.
"Ah, coitado", ria a professora Amélia Albuquerque, colega de outro ônibus fretado que ouvia a conversa, mas não fuma nem é torcedora do Timão.

Fumódromo
Outra coisa que deixa o corintiano Marcelo, 27, fumante desde os 15 anos, ainda mais sofredor é a nova lei antifumo. Antes da proibição, acendia os cigarros durante o expediente num fumódromo improvisado numa área coberta da empresa.
Agora, tem de atravessar a calçada par fumar do outro lado da rua. Mas o que o faz perder mesmo a paciência é ter de pagar a conta no bar para sair para fumar e não poder levar o copo de cerveja para fora.
"Para boate já não vou mais. Vai ter de sair para fumar, entrar e pagar de novo, não saio mais de casa. Só vou a barzinho que tenha uma área ao ar livre para fumantes", reclama.
No novo ponto de fretado da região da avenida Sumaré, ele se queixa ainda da falta de estrutura. Quando chegar o verão, diz, vai ser pior (porque ali alaga), e, como por lá não tem abrigo, vai chover no molhado.
Depois de tanto sofrimento, o corintiano diz que o último medo que lhe resta é a gripe suína. No trabalho, espalharam bombas de álcool em gel para desinfecção e ele é obrigado a lavar as mãos de tempos em tempos. O receio é maior ainda porque passou a andar de metrô lotado, que não tomava antes de ir para casa.

Gripe suína
Como não há limite para o pior, o analista de crédito Emerson André Medeiros Vieira, outro usuário de ônibus fretado, já até deixou de fumar, mas, na semana em que passou a andar de metrô para ir ao novo ponto de parada, adoeceu de gripe -justamente o medo de Marcelo, o corintiano sofredor.
"Nesse curto espaço de tempo fui afastado do serviço por sete dias em virtude de uma forte gripe. Atribuo o contágio à exposição à massa do transporte público. Seria esse o melhor momento para restrição aos ônibus fretados?", diz.
O corintiano Marcelo e o gripado Emerson não a conhecem, mas a história deles se repete na gestora de internet Aline Cristina Luna. Aos 21 anos, fumante há três, ela diz que a restrição aos fretados "ferrou" com a sua vida.
"Acordo uma hora mais cedo, chego 40 minutos atrasada todo dia no trabalho e ainda tenho de sair meia hora antes do fim do expediente para pegar o metrô, que está muito mais cheio, e não perder o ônibus", afirma Aline, que de uma semana para cá não pode mais fumar na cobertura aonde ia antes.
"Como fumante, fiquei "pê" da vida com essa lei. Vou deixar de ir aos bares onde não tenha espaço aberto para fumar. Daqui a pouco vão proibir até..." Ah, isso não dá para publicar.


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