São Paulo, segunda-feira, 13 de setembro de 2004

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RIO

Processos no Superior Tribunal Militar mostram que soldados e sargentos ajudam a desviar armamento pesado e facilitam furtos

Tráfico usa militares para reforçar arsenal

MARIO HUGO MONKEN
DA SUCURSAL DO RIO

Processos no STM (Superior Tribunal Militar) mostram que os traficantes das principais favelas do Rio de Janeiro estão cooptando militares de baixa patente para desviar fuzis, granadas e submetralhadoras dos quartéis ou ajudar em invasões às unidades para furtos das armas.
A Folha obteve investigações que chegaram ao STM, as quais comprovam a ação conjunta de militares e traficantes que buscam reforçar seus arsenais com armamento pesado.
Segundo os processos, neste ano, um cabo e um soldado da Marinha foram condenados por terem ajudado traficantes a invadir uma unidade da corporação em 2002 e três fuzileiros navais foram denunciados sob acusação de ter desviado armas de um quartel para vender ao tráfico.
O total de casos comprovados neste ano indica um aumento do número de militares envolvidos com o tráfico. Entre 1995 e 2003, só outros oito integrantes das Forças Armadas haviam sido condenados e quatro denunciados pelo mesmo motivo.
Os últimos condenados foram o soldado da Marinha Carlos Eduardo Mombrine Louzada -a seis anos de prisão- e o cabo Sidney Antunes Pessoa -a nove anos. De acordo com o Superior Tribunal Militar, ambos participaram da invasão à Estação Rádio Central da Marinha, em Duque de Caxias (Baixada Fluminense), no dia 25 de agosto de 2002.
Os dois e mais quatro homens armados renderam dois sentinelas do quartel e roubaram seis fuzis, duas pistolas, 247 munições e três coletes à prova de bala.
A invasão, segundo o processo, foi comandada por traficantes da favela do Dique, no Jardim América (zona norte). Louzada e Pessoa foram condenados em primeira instância, mas recorreram da decisão. Estão presos.

Desvio recente
Dois inquéritos sobre episódios recentes de desvio de armas em quartéis do Rio estão próximos de serem concluídos.
Em março, os fuzileiros navais Inácio Vicente da Silva, Cliff Bruce Moreno Ferreira e Sílvio Pimentel foram denunciados à Justiça Militar sob a acusação de terem furtado dez submetralhadoras do Centro de Reparos e Suprimentos do Corpo de Fuzileiros Navais, no dia 28 de fevereiro.
De acordo com a denúncia, Silva e Ferreira pretendiam vender as armas para traficantes, o que não ocorreu porque elas foram apreendidas antes.
Em agosto do ano passado, dois soldados e um cabo do Exército foram denunciados sob a acusação de terem desviado 1.100 munições do 3º Batalhão de Infantaria Blindado (em São Gonçalo, cidade a 25 km de distância do Rio), em junho de 2003.
Segundo a Promotoria Militar, a ação contou com a participação de um ex-militar e a munição foi vendida por R$ 5.000 ao traficante apelidado de Neném, da favela Vila do João, no complexo da Maré (zona norte).

Condenações
Outros processos da Justiça Militar mostram que armas roubadas por militares são destinadas a traficantes que atuam em favelas do Rio.
Em 2002, os soldados do Exército Alex Cardoso Barreto e Paulo César Mendonça foram condenados a dois anos de prisão pelo roubo de um fuzil do 1º Depósito de Suprimento, em Manguinhos (zona norte), em 20 de dezembro de 2001. O fuzil foi vendido a traficantes do morro do Chapadão, em Costa Barros (zona norte).
O sargento fuzileiro naval Fábio Reis, que servia no Batalhão de Operações Especiais de Fuzileiros Navais, foi condenado a quatro anos e seis meses de prisão depois que escutas telefônicas feitas em 2000 pela Polícia Civil comprovaram que negociava a venda de armas e munições desviadas de quartéis com o traficante Márcio José Guimarães, o Tchaca, do CV (Comando Vermelho).
Quando foi preso, no mesmo ano, a polícia apreendeu com Reis 539 munições, além de granadas de uso exclusivo da Marinha.
Já o soldado do Exército João Carlos Teixeira Coutinho foi condenado e expulso das Forças Armadas por ter furtado um fuzil do 24º Batalhão de Infantaria Blindado (Bonsucesso, zona norte), em maio de 2000. A arma, segundo os autos, seria vendida no morro da Fazendinha, no complexo do Alemão (zona norte).
Uma quadrilha formada por quatro militares do Exército foi desarticulada em 1995. Naquele ano, os soldados Mauro Luiz Garcia Silva, Marcelo Rozeno, Aílson Luiz dos Santos e o sargento Flávio Augusto Pereira foram condenados a penas de três a cinco anos de prisão, depois que ficou comprovado que desviaram munição para vender a traficantes.
Segundo relatório do STM, os quatro furtaram 21 caixas com 420 cartuchos de munição 7,62 mm do Batalhão de Forças Especiais (em Guadalupe, zona norte), onde serviam. Outras caixas de munição, além de granadas, foram desviadas posteriormente pelo mesmo grupo.
Segundo os autos, os militares manipulavam os registros de entrada e saída de munições para esconder os desvios. As munições foram vendidas em favelas como Rocinha e Dona Marta, ambas na zona sul, e no complexo de São Carlos (zona central).

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