São Paulo, domingo, 13 de dezembro de 2009

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USP faz testes com asfalto antienchente

Escola Politécnica estuda uma camada que retarda em 50% a velocidade com que as águas chegam aos rios e córregos

Outras tecnologias, como o fim da canalização de rios com concreto poderiam reduzir os impactos de inundações na cidade

MARIO CESAR CARVALHO
DA REPORTAGEM LOCAL

Enquanto São Paulo submergia na última terça-feira, uma rua dentro da USP (Universidade de São Paulo) enfrentava o temporal como se fosse uma chuvinha: as águas acumuladas no asfalto não ultrapassaram a altura da sarjeta. O segredo dessa rua, criada dentro do Laboratório de Hidráulica da Escola Politécnica, é uma nova tecnologia de asfalto.
"O asfalto fica tão poroso quanto a areia da praia", compara José Rodolfo Martins, professor de engenharia hidráulica da Escola Politécnica da USP, que conduz o experimento com dez pesquisadores.
A pesquisa da Politécnica tem uma ligação direta com o alagamento e o caos da última semana: a meta é criar um revestimento que retarde em 50% a velocidade com que as águas chegam aos rios e córregos da cidade. "O objetivo é reter a água nas ruas para evitar enchentes", diz Martins.
O asfalto antienchente faz parte de um novo arsenal contra as cheias, junto com a abertura de córregos que foram canalizados e a construção de reservatórios para guardar a água da chuva em prédios, batizados de "piscininhas".
Aumento da porosidade da cidade é essencial para reduzir o impacto das enchentes por duas razões, segundo o engenheiro Mario Thadeu Leme de Barros: eleva a absorção de água e reduz a criação de ilhas de calor, que potencializam as tempestades. Segundo ele, asfalto poroso pode ser usado em grandes áreas impermeáveis, como estacionamentos.
"As técnicas tradicionais de controle de cheias já não funcionam numa cidade tão complexa como São Paulo", afirma Sadalla Domingos, também professor da Poli e defensor de um movimento que mal começou no país -a renaturalização dos rios, com o fim da canalização de concreto e o plantio de vegetação nas margens.
Retirar o concreto de córregos ajuda a combater enchentes porque a água é absorvida pelas margens e demora mais para chegar aos pontos críticos.
A prefeitura, com a Sabesp, já destampou cinco córregos, todos na periferia da cidade. Cada cem metros de rio reaberto custa R$ 750 mil, segundo Elisabete França, superintendente da Secretaria de Habitação -o valor inclui até a remoção de famílias que viviam nas margens. "Não é um custo absurdo para recuperar a nascente de um rio", afirma.
Regina Monteiro, diretora da Emurb (Empresa Municipal de Urbanização) que articulou o projeto Cidade Limpa, acha a iniciativa da prefeitura tímida: "Tinha de destampar o Tamanduateí, mas só eu e o Eduardo Jorge [secretário do Verde] defendemos isso", diz, referindo-se ao rio que corre ao lado da avenida do Estado.
A ideia de tirar o concreto das margens do Tamanduateí ganhou força depois que o prefeito Gilberto Kassab (DEM) visitou em maio deste ano o rio Hangang, em Seul, na Coreia do Sul, que foi despoluído e descanalizado. O projeto do Tamanduateí não foi adiante, segundo Monteiro, "porque os técnicos têm medo [do resultado] e deixam os políticos inseguros".
Seul tornou-se um caso exemplar porque um rio fétido foi convertido em parque. Mas há exemplos de renaturalização em Paris, onde o La Bièvre está perdendo canais construídos há 200 anos, em Londres e nos EUA. Lá, a agência ambiental criou até manual para ensinar a renaturalizar rios.
Não é por falta de leis que São Paulo patina no uso de novas técnicas antienchente. A cidade tem leis que obrigam estacionamentos a céu aberto a reservar uma área para árvores (2002), empreendimentos a criar calçadas permeáveis (2006) e prédios a construírem reservatórios para guardar água da chuva (2007).
Os números não são animadores. A prefeitura bancou a construção de 353 quilômetros de calçadas permeáveis entre 2005 e 2007 -equivalem a 1% dos 30 mil quilômetros de calçadas. Nesse ritmo, seriam necessários 255 anos para mudar todas as calçadas da cidade.


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