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São Paulo, sexta-feira, 14 de fevereiro de 2003

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BARBARA GANCIA

"Tá ruim, mas tá bão!"

O leitor com prática da vida já deve ter ouvido a prosaica máxima usada por Tom Jobim para comparar os Estados Unidos ao Brasil. Jobim costumava dizer que "lá é bom, mas é uma m..." e que "aqui é uma m..., mas é bom".
Pois, outro dia, o porteiro do meu prédio, o Alves, veio com uma variação sobre o tema. Disse-me ele que seu irmão, que nunca saiu de Feira de Santana, na Bahia, e que certamente desconhece a opinião que Tom Jobim tinha sobre Nova York vis-à-vis ao Rio de Janeiro, é um otimista no melhor estilo tapuia. Quando o cinto aperta, o irmão do Alves diz assim: "Tá ruim, tá não? Tá ruim, mas tá bão".
Não é que o pensamento linear do irmão do porteiro do meu prédio consegue sintetizar o atual estado das coisas?
"Tá ruim, mas tá bão." Ano passado, o verão foi do "Bonde do Tigrão" e da "cadela". Neste ano, ele pertence à "Égua Pocotó". Quem vê pensa que o brazuca divide os anos por bichos, como fazem os chineses com seu horóscopo de animais. Quisera!
A coisa vem descambando desde aquele verão em que Carla Perez inventou de namorar uma garrafa. Num ano as mulheres viram cadelas, noutro, éguas. Minha aposta é que, no ano que vem, o tema da trilha sonora do verão seja inspirado na piranha. No ano seguinte, podemos ir de galinha, depois de vaca e assim por diante.
Fico pensando na garotada que cresce ouvindo esse funk bestial. Minha geração também se divertia com invenções chulas, mas a diferença entre, digamos, o disco do show de Juca Chaves, que embalou o verão de 1971, e a agressividade sexista das letras de hoje é mais ou menos a mesma que exis
te entre os Teletubbies e as pegadinhas do Sérgio Mallandro.
"Tá ruim, mas tá bão". A Academia de Artes e Ciências de Hollywood ficou nos devendo. Por tudo que "Cidade de Deus" representa e pelo que fez nas comunidades por onde passou, o filme merecia uma indicação para melhor filme estrangeiro. Na Inglaterra foi tão bem recebido que os críticos chegaram a sugerir que "Cidade de Deus" fosse indicado na categoria de Melhor Filme, com "Gangues de Nova York", "Chicago" e "As Horas".
"Tá ruim, mas tá bão". Não gosto nem de pensar no que vai acontecer com aquele argentino que vive dentro do Caetano Veloso se ele se tornar o primeiro brasileiro a ganhar um Oscar (pela música "Burn it Blue", que interpreta em "Frida").
Torço por ele, mas já imaginou o tamanho do salto?


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