|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Polícia culpou chuva por acidente em 2005
Laudo do Instituto de Criminalística inocentou consórcio por imóveis afundados no entorno da estação Pinheiros do Metrô
Atribuir desabamento à
chuva e à geologia do
terreno é "fantasia", aponta
geólogo que foi responsável
pelos túneis do Metrô
MARIO CESAR CARVALHO
KLEBER TOMAZ
DA REPORTAGEM LOCAL
Não é só empreiteiras que
culpam a chuva por desabamentos em túneis. Um laudo
do IC (Instituto de Criminalística) da Polícia Civil inocentou
o consórcio Via Amarela por
um acidente ocorrido no final
de 2005 na Estação Pinheiros
sob o argumento que os culpados eram a geologia do terreno
e as chuvas. Dois especialistas
em geologia e obras ouvidos pela Folha dizem, de forma mais
ou menos diplomática, que o
laudo não tem base científica.
No dia 3 de dezembro de
2005, por volta das 2h da manhã, os donos da casas nos número 157 e 163 da rua Amaro
Cavalheiro tiveram que desocupar o imóvel porque ele começou a afundar. Duas horas
depois, as casas desabaram. No
dia seguinte, uma terceira casa
rachou numa rua ao lado, a
Ferreira de Araújo.
Todas ficam nas imediações
da estação Pinheiros, a mesma
onde ocorreu o desabamento
que provocou a morte de sete
pessoas há um mês.
Como não houve vítimas em
2005 e as famílias foram indenizadas pelo consórcio -OAS,
CBPO (do grupo Odebrecht),
Queiroz Galvão, Camargo Corrêa e Andrade Gutierrez- o inquérito que apurava a responsabilidade pelo acidente foi arquivado pela Justiça em 19 de
setembro de 2006. Ninguém
foi punido.
Os engenheiros do Instituto
de Criminalística que assinaram o laudo, José Manuel Dias
Alves e Antonio de Carvalho
Nogueira Neto, haviam classificado o acidente como "súbito e
imprevisível".
No laudo da polícia, os dois
engenheiros escreveram que o
desabamento foi "causado pela
saturação do solo devido às fortes chuvas já mencionadas,
combinados com a geometria
irregular e pontual do maciço
rochoso a cerca de 20 metros
abaixo da superfície do solo".
Essa é a passagem que os especialistas criticam.
"A leitura desses documentos judiciais, causou-me, como
técnico e cidadão, um doloroso
sentimento de revolta e asco",
diz o geólogo Álvaro Rodrigues
dos Santos, ex-diretor de planejamento e gestão do IPT
(Instituto de Pesquisas Tecnológicas).
"Quem escreveu isso não entende nada. É uma fantasia",
afirma Kenzo Hori, geólogo
que foi o responsável pelos túneis do Metrô, principalmente
os das linhas 4 e 5.
A pedido da Folha, os dois
especialistas analisaram o resultado do laudo sobre o acidente de 2005.
Não foi a chuva
Hori, que ingressou no Metrô em 1968 e saiu da companhia 30 anos depois, é categórico ao rechaçar a hipótese dos
engenheiros do IC de que a
chuva provocou o desabamento: "Se fosse chuva teria caído
tudo. [O túnel] Caiu porque teve uma cavidade embaixo. Pode
ser muita coisa além da chuva
ou a chuva não tenha nada a ver
com isso", arrisca.
Rodrigues dos Santos diz que
"não existe a menor possibilidade de ocorrência de acidentes em obras de engenharia civil por força de imprevistos da
natureza, como chuvas, e fatores geológicos". Geologia e pluviometria da área da obra são
estudados há mais de uma década, no caso de linha 4.
Segundo o geólogo, a polícia e
os engenheiros que assinam o
laudo foram "levianos".
"Foram decisões nitidamente orientadas a eximir de qualquer responsabilidade e culpabilidade o Consórcio Via Amarela", diz Rodrigues dos Santos.
Mais investigação
Debater o laudo de 2005 não
é um questão acadêmica, segundo Rodrigues dos Santos:
"Tenho absoluta certeza de
que, caso o acidente da rua
Amaro Cavalheiro tivesse sido
investigado com total isenção e
rigor técnico, o trágico acidente
da rua Capri não haveria ocorrido. Como se vê, a leviandade
técnica tem um altíssimo preço". No caso, foram sete mortes
e uma obra parada.
Texto Anterior: Adminstração: Kassab descentraliza cargos comissionados Próximo Texto: Laudo não foi feito com chutes, diz engenheiro Índice
|