São Paulo, quarta-feira, 14 de abril de 2010

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ANÁLISE

Mudança sem a estrutura necessária

BIANCA CORREA
ESPECIAL PARA A FOLHA

A aprovação da legislação federal que tornou obrigatório o ingresso aos seis anos no ensino fundamental e a ampliação de sua duração, passando de oito para nove anos, teve como justificativa aumentar oportunidades educacionais da maioria da população infantil e, com isso, garantir melhoras na aprendizagem. Mas não é isso o que temos observado.
Os sistemas municipais e estaduais de educação parecem ter ampliado em um ano a sua oferta sem garantir o que está preconizado em documentos de orientação do MEC e em normas do CNE. Assim, observamos que as escolas não foram reestruturadas, professores não foram devidamente orientados e os projetos pedagógicos não sofreram as reformulações necessárias para atender ao novo público que chega ao ensino fundamental: crianças de seis anos, cujas necessidades de aprendizagem e desenvolvimento são bastante peculiares.
O que temos constatado são professores sem saber como proceder, já que, em tese, não devem mais atuar como atuavam com as antigas primeiras séries, mas tampouco têm condições de atender à demanda pelo brincar expressa pelas crianças. Além disso, esses professores continuam sendo cobrados por resultados em avaliações ao final do primeiro ano do ensino fundamental.
As crianças, por sua vez, forçadas a permanecer sentadas escrevendo ou fazendo exercícios de matemática -ainda que sem compreender o que parecem só reproduzir mecanicamente-, resistem. Resistem e brincam. Com esse comportamento, entretanto, provocam reações de professores que, em geral, são de contrariedade, já que não receberam formação para compreender por que brincar é tão importante para essa faixa etária.
Os sistemas nem sequer conseguem definir a idade de corte adequada para matrícula.
Exemplo disso é a rede estadual paulista e as confusões que tem promovido. A prosseguirmos assim, continuaremos com aumento nos índices de reprovação e com a aberração dessa ocorrência entre crianças ainda tão novas, ou, pior, seguiremos com um modelo de escola que, mesmo quando não reprova, não consegue garantir o direito à ampliação de conhecimento.
Mudanças formais na lei não garantem melhora do ensino, e o que temos constatado é que essas mudanças têm sido efetuadas de maneira imprudente.
Então, resta a pergunta: quem responderá pelos resultados de tantas mudanças impostas de forma desarticulada e sem a estrutura necessária?


BIANCA CORREA é professora do curso de pedagogia da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto (FFCLRP-USP)


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