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São Paulo, segunda-feira, 14 de julho de 2003

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PRÉ-NATAL

Levantamento feito a partir de dados de 2002 de programa do Ministério da Saúde mostra que a assistência é parcial

Só 5% das gestantes têm atendimento ideal

GABRIELA ATHIAS
LUCIANA CONSTANTINO
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Enquadrado entre os países com alta mortalidade materna, de acordo com critérios da Organização Mundial da Saúde, o Brasil ainda não cuida das gestantes com a devida atenção. Oferece, em alguns casos, assistência desarticulada e parcial.
Pesquisa inédita realizada com dados do próprio Ministério da Saúde mostra que, no ano passado, apenas 5% das gestantes inscritas no Programa de Humanização no Pré-Natal e Nascimento receberam o conjunto de atendimento previsto no projeto.
O pacote integral inclui pelo menos seis consultas de pré-natal, a consulta de puerpério (período após o parto até que o organismo da mãe volte às condições pré-gravidez), exames básicos como o de sangue e de urina e doses de vacinas -antitetânica, por exemplo. Incluindo-se o teste de HIV nesse pacote, o percentual de atendimento cai para 4%.
O índice melhora se consideradas apenas as seis consultas ou mais de pré-natal -benefício que chegou a 22,63% das inscritas- ou se contabilizados, além de consultas, só os exames -11,35%.
Os dados constam da tese de doutorado da médica Suzanne Jacob Serruya, defendida na última semana na Unicamp (Universidade Estadual de Campinas).
No estudo realizado, a médica avaliou a experiência de implantação do Programa de Humanização no Pré-Natal e Nascimento, gerido pelo Ministério da Saúde, que começou a funcionar no país em junho de 2000.
"Os pontos de estrangulamento detectados na atenção, como a realização de exames laboratoriais e a consulta puerperal, sinalizam a necessidade de rever mecanismos atuais e propor novas medidas", afirma a médica em suas conclusões no estudo.
Mesmo fazendo a ressalva de que o programa está em fase de implantação e conseguiu instituir importante sistema de informações, a médica afirma que ele aponta um retrato "preocupante e desafiador".
Segundo Márcia Cavalcante Vinhas Lucas, consultora da área técnica de saúde da mulher da pasta da Saúde, o programa de humanização mostra apenas uma parte da realidade do Brasil. Ainda não inclui todos os municípios.
"A partir de diagnósticos como esse é que poderemos redimensionar as ações de pré-natal", disse ela (leia texto nesta página).

O que é
Para fazer parte do programa de pré-natal, o município assina com o ministério um termo de adesão. O documento é, depois, homologado pelo Estado.
Antes de firmar o acordo, o prefeito precisa organizar o sistema de saúde de seu município, dotando-o de unidades de referência para diagnóstico, assistência ambulatorial e hospitalar à gestante. Exige-se também a organização de um sistema de informações.
Em contrapartida, o município inscrito recebe incentivos financeiros. Por exemplo: R$ 10 por gestante cadastrada e R$ 40 após a conclusão do pré-natal, desde que todos os critérios mínimos exigidos sejam cumpridos.
Lançado com o objetivo de melhorar o acesso, a cobertura e a qualidade do pré-natal, do parto e do puerpério, o programa de humanização recebeu a adesão de 3.983 municípios. Desses, 3.183 registraram dados no sistema. Há informações disponíveis sobre 720.871 gestantes.

Mortes
Apesar de a mortalidade materna não ter sido objeto da pesquisa, Serruya diz que a qualidade do pré-natal é um dos fatores que influenciam nessa taxa.
As principais causas de morte materna no país são hipertensão arterial, hemorragias e infecção pós-parto, todas evitáveis com um pré-natal de qualidade e outras medidas simples.
Em 2001, eram 74,5 mortes maternas para cada 100 mil nascidos vivos nas capitais. Em países desenvolvidos, a taxa varia de 6 a 20 mortes por 100 mil. O Ministério da Saúde diz ainda que os dados brasileiros são subnotificados.
"É possível prevenir e evitar cerca de 98% das mortes maternas. Isso mostra deficiências no pré-natal e na atenção ao parto e ao pós-parto", disse a médica Maria de Fátima Oliveira Ferreira, presidente da Rede Feminista de Saúde. Para ela, o programa de humanização é importante, mas precisa de alterações.
"Medidas simples, como aumentar o horário de atendimento nos postos de saúde e melhorar a qualidade do pré-natal, podem prevenir mortes. Não estamos nem falando em gastar mais, mas em oferecer serviço de qualidade", afirmou Ferreira.


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