São Paulo, quarta-feira, 14 de julho de 2004

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NUTRIÇÃO

Máquinas que oferecem guloseimas são tentação, por exemplo, para criança que faz tratamento contra obesidade

Hospital vende alimento que faz mal à saúde

DA REPORTAGEM LOCAL

Chocolates, chicletes, batata frita, salgadinhos de bacon... Com as mãos sobre o vidro, Evelyn observa todas as guloseimas que lhe são proibidas: aos dez anos, ela pesa 71 quilos, quase 30 a mais do que é recomendável para sua idade. O curioso é que a máquina que oferece à menina todas essas tentações está localizada justamente no local em que Evelyn vai para resolver o problema de obesidade: no hospital.
Há três meses, ela começou a freqüentar a Santa Casa da Misericórdia, em São Paulo, para consultar um nutricionista e um endocrinologista devido ao problema de peso.
"O nutricionista já orientou a gente. Ela está proibida de comer salgadinhos, chocolates, a alimentação tem que ser totalmente natural. Aí, sempre que venho aqui [na Santa Casa] tenho que trazer uma fruta de casa, porque a gente só encontra salgados, doces, os sucos são artificiais", afirma a mãe de Evelyn, Izailda Maria de Conceição de Sá Leitão, 41.
A permanência das máquinas de "snacks" no hospital tem sido alvo de preocupação no setor de nutrição da entidade. "A gente sabe que do ponto de vista nutricional os salgadinhos não são adequados, mas os clientes hoje estão cada vez mais exigentes. A maioria dos hospitais hoje conta com máquinas de salgadinhos, refrigerantes, café. Eles querem ter isso aqui também", afirma Ana Lucia Torloni Gradinar, 41, administradora da unidade de nutrição e dietética do hospital.
Na Santa Casa, há duas máquinas. No Hospital Sírio Libanês, também há duas. No Incor (Instituto do Coração), há só uma máquina, localizada no ambulatório. No Hospital Nove de Julho, são cinco máquinas.
Os três últimos hospitais afirmam, porém, que oferecem outras opções de alimentação a seus clientes, em lanchonetes e restaurantes, e que as máquinas são localizadas em áreas de espera, para os acompanhantes dos pacientes.

Calorias vazias
O problema dos salgadinhos é que eles representam o tipo de alimento que os médicos aconselham a evitar. Segundo Gradinar, geralmente eles são gordurosos, têm corantes e representam "calorias vazias", ou seja, ao consumi-los, a pessoa ingere muitas calorias, mas poucos nutrientes.
Os riscos à saúde não estão apenas relacionados ao aumento de peso ou de colesterol. O consumo em excesso desses alimentos pode levar a problemas gástricos, acrescenta a nutricionista Silmara Truvilho Peres, 37, também da Santa Casa.
Ainda assim, as máquinas apresentam vantagens. Além de serem mais baratas e ocuparem um espaço muito menor do que uma lanchonete, elas oferecem produtos para consumo rápido. "O acompanhante que está no pronto-socorro, no sétimo andar, prefere comprar um salgadinho na máquina que está ao lado dele do que subir até o 12º andar para ir à lanchonete", exemplifica Patrícia Ramos, 28, nutricionista do hospital Nove de Julho.
"Essa alternativa foi feita para suprir as necessidades de acompanhantes em horários críticos, pois nas proximidades do hospital não existem locais para alimentação. Dentro do hospital, existem outras alternativas, que têm horário específico de funcionamento", afirma Mirian Osorio, do serviço de nutrição dietética do hospital Sírio-Libanês.
A administradora da unidade de nutrição e dietética do hospital aponta outro aspecto positivo. "Pelo menos a gente sabe a procedência desses salgadinhos. A gente enxerga que eles apresentam um risco muito menor do que esses pastéis que nossos pacientes costumam comer em camelô na rua", diz Gradinar, ressaltando que o consumo esporádico de salgadinhos não compromete a dieta de pessoas saudáveis.
Essa é a mesma opinião da dona de casa Neide Soares de Moraes, 42. "Enquanto a gente espera o atendimento, vou comendo um salgadinho, por mais impuro que seja, é melhor do que comprar sanduíche na rua."
Mas a questão é controversa mesmo entre os consumidores. "Essas máquinas não poderiam ser permitidas em hospitais porque todo mundo sabe que esses produtos são cheios de conservantes. Eles não devem endossar esse consumo, quem quiser que vá comer na rua", rebate a cineasta Diva Perez, 68.
Para tentar resolver esse dilema, a nutricionista do Nove de Julho, Patrícia Ramos, optou por uma empresa cujas máquinas têm mais opções de alimentos, como barras de cereais. Ela também estuda a possibilidade de colocar no hospital máquinas com sanduíches. "Enquanto isso, a gente tem a preocupação de colocar também nas máquinas produtos que são dietéticos."
(AMARÍLIS LAGE)


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