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LETRAS JURÍDICAS
Ensino jurídico: 500 anos depois
WALTER CENEVIVA
da Equipe de Articulistas
O ensino jurídico brasileiro
tem apenas 172 anos, pois somente a partir de 11 de agosto
de 1827 se instalou o primeiro
curso na Faculdade de Direito
do Largo de São Francisco, em
São Paulo. Seguiu-se a ela a instalação da Faculdade de Olinda. Antes da Independência, todos os advogados eram homens
e formados, sobretudo, na Universidade de Coimbra.
Os monarcas portugueses tinham todo o interesse em manter a sociedade da Colônia dependente da Metrópole e o mais
distante possível de qualquer
instituição superior de ensino.
Por isso os juristas que fizeram a Constituição imperial de
1824 tinham formação portuguesa. Na América espanhola
foi diferente, porquanto muitas
escolas foram abertas no período colonial. O ensino jurídico
em Coimbra era de boa qualidade, mas compunha um dos
elementos afirmadores do direito português e da predominância de seu império. Angola e
Moçambique, muitos anos depois da Independência brasileira, continuaram a receber o
mesmo tratamento dos governos lusitanos.
A literatura jurídica vinha em
linguagem rebuscada, inacessível ao povo em geral. A aula era
muitas vezes confundida com
certames de oratória, brilhante
nos primeiros dias, mas cada
vez mais cansativa ao longo do
curso. Esse modo de ver o ensino
demorou muito a acabar e ainda era encontrado, no Largo de
São Francisco, nos anos 50,
quando ali estudei.
A lei de 11 de agosto de 1827
tratou igualmente São Paulo e
Olinda, criando nove cargos de
professor titular. Nas escolas
pioneiras e nas que vieram logo
depois, a relação mais frequente
entre o professor e o aluno tendia a ser rigidamente vertical,
sem liberdade para discutir as
informações vindas da cátedra,
mas permitiu o surgimento de
bons juristas. Mesmo assim, porém, a evolução, até a primeira
metade do século 20, foi lenta.
Progressiva, é verdade, mas sem
alteração substancial.
O número de
escolas é
excessivo. O
mercado de
trabalho
jurídico não
absorve os
formados.
Na segunda metade deste século surgiram a quantificação
e, como dado mais expressivo, o
crescimento da participação feminina nos cursos e nas profissões jurídicas. A explosão numérica teve como fator decisivo
a industrializaç ão do ensino, a
partir de 1964. Tudo se facilitou
aos empreendedor es, saltando
as três faculdades existentes no
Estado de São Paulo para quase
15 vezes mais. Abriu ensejo à
formatura sem informação suficiente para milhares de estudantes, submetidos a improvisados corpos docentes.
A facilidade industrial (diz-se
que a faculdade precisa de sala,
cadeira, quadro negro e giz)
ampliou os quadros docentes,
muitas vezes compostos por
gente sem outra capacitação
que o diploma, a aceitação de
salários pífios e de disciplina
nos horários.
O rumo do futuro não é claro.
O número de escolas é excessivo.
O mercado de trabalho jurídico
não absorve os formados. Entre
1930 e 1970 inscreveram-se na
OAB cerca de 190 mil advogados. O número mais que dobrou
nos 25 anos seguintes, havendo
140 mil em São Paulo.
O exame de ordem, que acolheu perto de 15 mil candidatos
este ano, na OAB/ SP, tende a
dificultar - o que é bom - a
transformação do bacharel
inapto no advogado incompetente. Nas carreiras públicas os
concursos de ingresso afastam
disputantes sem preparo. Nem
todos, porém. O ensino, no próximo século, terá de satisfazer a
qualidade exigida pelo mercado, para profissionais confiáveis, quanto ao conhecimento
técnico, mas providos da cultura geral, que faz muita falta na
atualidade.
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