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NÃO
Liberdade e competência
IVES GANDRA DA SILVA MARTINS
ESPECIAL PARA A FOLHA
O governador José Serra, a título de proteção à saúde, no Estado, enviou projeto de lei à Assembléia Legislativa proibindo
que se fume em restaurantes,
áreas públicas e condominiais,
táxis etc.
A campanha lastreia-se em
pesquisas segundo as quais a
queda do número de fumantes
diminuiu o custo hospitalar para tratamento de câncer e que
os não-fumantes terminam por
ser afetados, ao absorverem a
fumaça exalada.
Embora meritória a campanha -eu sou não-fumante-,
acredito que o projeto de lei é
inconstitucional, por atingir a
liberdade das pessoas de fumarem ou beberem (não há projeto de lei proibindo bebidas alcoólicas nos restaurantes), apesar de o fumo e a bebida gerarem dependência e fazerem
mal à saúde. Parece-me, ainda,
inconstitucional no que invade
a competência dos municípios
de legislar sobre assuntos de interesse local (art. 30 inc. I da
Constituição Federal).
É bem verdade que cuidar da
saúde é responsabilidade das
três entidades federativas, mas
não se pode produzir uma lei,
em âmbito estadual, apesar da
competência legislativa concorrente (art. 24 inc. XII), que
interfira na área de atuação privativa dos municípios ou substitua a competência das normas gerais pertinentes à União
(par. 1º art. 24).
O direito de licenciar e definir
as regras que devem conformar
os estabelecimentos de lazer,
em qualquer município, é do
próprio burgo. Se um estabelecimento, sem que haja lei municipal em contrário, declarar que
admite, em suas dependências,
fumantes e não-fumantes, os
não-fumantes deverão procurar outros estabelecimentos,
que não permitam fumantes ou
que os separem dos demais
usuários. Tal competência é exclusiva dos municípios.
O mesmo se diga em relação
aos condomínios. Apesar de
muitas assembléias condominiais proibirem a presença de
cachorros, o Poder Judiciário
autorizou os proprietários de
apartamentos a mantê-los, nada obstante o incômodo que os
latidos provocam aos não-adeptos de ter animais em seus
prédios.
E, por fim, nos táxis, caberá ao
motorista decidir se permite ou
não que o passageiro fume, até
porque a autorização para o serviço de táxis é municipal.
Da lei antifumaça, poderemos
chegar à "lei seca" semelhante à
da época do "gangsterismo" de
Chicago, nos EUA, pois fumo e
bebida fazem mal à saúde.
Numa democracia, deve-se
respeitar a Lei Suprema e a liberdade das pessoas e, quando
determinados comportamentos forem indesejáveis, caberá à
União definir os parâmetros
que deverão ser seguidos pela
fiscalização das demais entidades federativas.
IVES GANDRA DA SILVA MARTINS , 73, advogado, professor emérito da Universidade Mackenzie, da Escola de Comando e Estado-Maior do
Exército e da Escola Superior de Guerra, é presidente do Conselho Superior de Direito da Fecomercio e do Centro de Extensão Universitária
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