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SIM
Bom senso e saúde coletiva
DAMÁSIO DE JESUS
ESPECIAL PARA A FOLHA
A polêmica sobre as restrições ao fumo no Brasil está encoberta por uma densa fumaça de argumentos nebulosos.
É preciso dissipá-la com um
ventilador de bom senso e conhecimento jurídico e dizer
claramente: a proibição protege a saúde de quem não fuma
e, justamente por isso, é constitucional.
A União e o governo paulista
apresentaram recentemente
projetos que, na prática, proíbem o fumo em locais fechados, públicos ou privados. Se
forem aprovados, restará aos
fumantes a rua ou a sua própria casa para usufruírem de
seu hábito.
Para discutir a legalidade
dessas propostas, é preciso
entender que o que as motivou foi a proteção à saúde coletiva.
São de conhecimento público os efeitos nocivos do fumo
passivo -mata sete brasileiros todos os dias por doenças
decorrentes da exposição à fumaça, segundo o Instituto Nacional de Câncer (Inca). E sabe-se também que o Ministério da Saúde gasta mais de R$
300 milhões a cada ano para
tratar quem sofre de doenças
causadas pelo cigarro.
A competência para tratar
da saúde dos brasileiros é
compartilhada entre a União,
os Estados e os municípios. O
governo federal fixa as diretrizes gerais e as administrações
locais podem, sim, complementar com regulamentações.
Logo, quem diz que há ofensa à autonomia dos municípios e alega que é inconstitucional uma lei estadual que
pretende proteger os moradores das cidades do fumo passivo em ambientes fechados
precisa conhecer melhor a
nossa legislação.
Outros eminentes advogados argumentam que o tabaco
é um produto lícito e que
seu consumo pode ser dis-
ciplinado em lei, mas jamais
suprimido.
Ora, nenhum dos projetos
em discussão proíbe terminantemente o cidadão de fumar. Só impede que a fumaça
incomode a pessoa que está ao
seu lado -ou prejudique a
saúde dela.
A discussão jurídica dá lugar
ao contraditório. E isso é bom,
pois possibilita um amadurecimento da opinião pública.
O que não é bom para a democracia é uma demonstração
de desrespeito à legislação vigente, justamente do mais alto
mandatário eleito do país.
Quando o presidente Luiz Inácio Lula da Silva defende o fumo dentro de seu gabinete em
Brasília, ao arrepio da lei (há
um decreto que proíbe o fumo
no Palácio do Planalto), ele
confunde o espaço público
com o privado. E nos faz
lembrar de um Brasil que queremos mudar -em que as leis
valem para uns, mas não para
todos.
DAMÁSIO DE JESUS , 73, é advogado, membro
do Instituto de Criminologia da ONU e diretor-geral da Faculdade de Direito Professor Damásio de Jesus
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