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opinião
O importante hoje é fazer e acontecer
ROSELY SAYÃO
COLUNISTA DA FOLHA
"Um bom lugar para ver
e ser visto"; "O mundo é de
quem faz". Essas frases, a
primeira escrita em um
guia de bares e restaurantes e a segunda em uma
peça publicitária veiculada em televisão, retratam
e condensam bem o estilo
de viver que adotamos. O
importante hoje é ter visibilidade, fazer e acontecer,
ter liberdade absoluta e
poder ilimitado. Esse é o
mundo adulto que construímos tijolo por tijolo e
no qual vivemos.
É nesse mesmo mundo
a que os jovens foram introduzidos e onde vivem
com algumas vantagens
em relação aos adultos,
entre elas o domínio íntimo e rápido das novas tecnologias e, principalmente, a posse da juventude de
verdade. Sim, são eles que
têm o poder da juventude,
juventude esta que nós
nos dedicamos tanto a mimetizar. Ao lado das vantagens, porém, eles vivem
com inúmeras desvantagens em relação a nós.
Bem ou mal, querendo
ou não, somos adultos e
sabemos a diferença entre
o certo e o errado, entre o
digno e o indigno. Eles ainda não. Temos condição de
fazer previsões. Eles ainda
não. Temos autonomia para administrar nossa vida,
sabemos que para escolher é preciso renunciar,
podemos proteger nossa
intimidade. Eles ainda
não. Deveriam ter aprendido, mas quem esteve disponível para ensiná-los?
Adolescência é tempo
de amadurecer. Mas, para
garantir que a nossa juventude disfarçada não seja ameaçada, temos impedido que os adolescentes
amadureçam. Temos preferido que eles voltem a
brincar, como se vivessem
a primeira infância.
Enchemos nossos filhos
de brinquedos sofisticados
e os mandamos para as
festas regadas a bebidas
que nós mesmos preparamos. Fazemos de tudo para que se divirtam, sejam
sociáveis e populares entre os pares, vivam plenos
de felicidade.
Em troca de tanto, pedimos muito pouco: apenas
seu êxito escolar e sua intimidade. Passar no vestibular, cursar uma boa faculdade e revelar todos os
seus segredos para nós: é
isso o que esperamos deles. E eles obedecem -ou
ao menos tentam.
E lá vão eles procurar viver a vida como a desenhamos: ter visibilidade, fazer
e acontecer com liberdade
absoluta e poder irrestrito.
De vez em quando, fazem
coisas que consideramos
erradas, ruins, indignas.
Aí, só nos resta dizer que
essa juventude está perdida, não tem limites, perdeu o eixo, é vazia.
É verdade: para muitos
jovens a vida não tem sentido e, por isso, vivem em
busca de grandes aventuras. Afinal, eles precisam
tentar escapar, do jeito
que podem e sabem, do
enfado que esse tipo de vida que deixamos de herança a eles provoca.
ROSELY SAYÃO é psicóloga e colunista
do Equilíbrio
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