São Paulo, sexta-feira, 14 de novembro de 2008

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Para psicólogos, jovens se sentiram impunes

VINÍCIUS QUEIROZ GALVÃO
DA REPORTAGEM LOCAL

Psicólogos e psiquiatras especialistas em comportamento adolescente dizem ver com estranheza a conduta violenta atribuída aos três jovens acusados de estupro. Para eles, em situações como esta, há vestígios anteriores de distúrbios, que podem ter sido escamoteados ou relevados por pais, por amigos ou pela escola.
Alexandre Saadeh, do serviço de psicoterapia do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas de São Paulo, diz que, até pelo excesso de crueldade do caso, já havia sinais de personalidade e que um crime como esse cometido por jovens "não se manifesta de maneira isolada".
"Antes de uma conduta mais violenta e desrespeitadora de normas e de regras, pela crueza do caso, já havia sinais. Por mais bêbados que estivessem, é muita violência e muita maldade para essa situação. Chama a atenção o requinte de crueldade que foi usado contra a menina", afirma Saadeh.
Psicólogo especializado em adolescência, Miguel Perosa, da PUC de São Paulo, ressalta que a "sensação de impunidade" que os jovens tiveram, por serem de classe média, os impulsionou a cometer o crime.
"Para colocarem isso na internet é preciso que se sintam impunes, que a realização do desejo seja legítima. Eles imaginam que o que fizeram é correto e que nada vai acontecer com eles. Essa pressuposição da impunidade é que me chama a atenção", diz Perosa.
Segundo Saadeh, a conduta em grupo é comum na formação da personalidade do adolescente e, nessa idade, "há uma questão transgressora de romper limites, de romper determinadas normas e regras".
"Agora, há coisas que não se pode relevar, como violência sexual e assassinatos. E eles sabem o que é certo e o que é errado. Aos 18 anos já são capazes e imputáveis", afirma Saadeh. "O grupo dá reforço. Estar em três é bem mais "confortável" [para] cometer uma coisa dessas do que sozinho", completa.

Desejo
Para Perosa, na adolescência os jovens ficam "subservientes ao desejo, que não pode ser frustrado" e a bebida alcoólica "provoca um relaxamento da conduta moral" e "libera mais o impulso". "Mas para colocar o vídeo na internet o efeito do álcool já deve ter passado. Então eles estavam claramente conscientes", afirma Saadeh.
Segundo diz, colocar o vídeo na rede foi "uma tentativa de se vangloriar de alguma forma". "Colocar na internet é querer destruir a menina sem a menor noção de que isso os compromete. É uma prova."
"Se realmente achassem que era crime, porque iriam se denunciar colocando as imagens na internet? Na cabeça deles era preciso satisfazer o desejo, "eu quero, eu faço". Não sei se eles tiveram a percepção de crime", completa Perosa.
Para ele, os pais "precisam dizer "não" mais freqüentemente". "Passamos, de uns 50 anos para cá, a achar que é proibido proibir, que a lei não liberta, restringe. E ficamos subservientes ao desejo, que não pode ser frustrado."


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