São Paulo, domingo, 15 de fevereiro de 2004

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PRESÍDIOS

Taxa de HIV/Aids diminui após queda no consumo de drogas injetáveis; Plano Nacional de Saúde começa a ser implantado

Crack faz aumentar hepatite em presos

AURELIANO BIANCARELLI
DA REPORTAGEM LOCAL

A cocaína injetável está desaparecendo do sistema penitenciário paulista. Nas "varreduras" que a Tropa de Choque costuma fazer no interior das celas, foram encontradas "pouquíssimas seringas" nos últimos dois anos.
Segundo a Coordenadoria de Saúde do Sistema Prisional, órgão da Secretaria de Estado da Administração Penitenciária, a taxa de presos com HIV/Aids está atualmente entre 2,5% e 5,5%, dependendo do local. Há dez anos, a proporção chegava a 22% na Casa de Detenção (Carandiru).
Esse é o lado positivo da queda do uso de droga injetável. O lado negativo é o aumento do uso do crack e o crescimento vertiginoso das hepatites C e B. Uma pesquisa com um grupo de presos da Penitenciária 2, de São Vicente (Baixada Santista), revelou que 52% estavam com hepatite B, 18,3% com hepatite C e 18,6% com HIV/Aids. "Os números precisam ser vistos com cautela, pois trata-se de apenas um grupo de presos, voluntários", diz Ilham El Maerrawi, coordenadora do programa municipal de DST-Aids de São Vicente. "De todo modo, a situação é alarmante."
A Aids e as hepatites nos presídios foram tema da 1ª Conferência de Redução de Danos da América Latina e do Caribe, realizada nesta semana em São Paulo.

Troca de seringas
Em Bilbao, na Espanha, há um projeto oficial em que presos recebem seringas. No Brasil, há 12 projetos -financiados pelo Ministério da Saúde e realizados por ONGs ou coordenações municipais de DST-Aids- que fazem trabalhos em presídios.
Na teoria, não é permitida a troca de seringas, como acontece nos 126 programas do lado de fora. Na prática, as seringas acabam entrando. Segundo o Ministério da Saúde, desde que esses 12 projetos foram iniciados, há dois anos, 17 mil seringas já foram disponibilizadas para os presos.
Em alguns presídios, os kits de redução de danos -com folhetos, camisinhas e seringas, que os agentes de saúde usam para dar "aulas"- ficam em lugares onde os presos depois os recuperam.
No Instituto Penal de São José do Rio Preto, o trabalho começou com barbeiros e tatuadores para impedir a transmissão de hepatites entre os presos.
Uma parceria entre a coordenação municipal de Aids e a ONG Grupo de Apoio aos Doentes de Aids providenciou agulhas e treinou os profissionais. "Trabalhamos para que os funcionários assumam a atenção básica dentro do presídio", diz Maria Inês Spinelli Arantes, coordenadora do programa municipal.
Maria Eli Bruno, coordenadora do Sistema de Saúde Prisional do Estado, diz que em São Paulo o principal uso hoje é o de crack, que facilita a transmissão de hepatite. "As hepatites serão o grande problema dos presídios", diz.
Dez anos atrás, chegavam a ocorrer duas mortes por Aids por dia na Casa de Detenção. Em janeiro passado, no Estado todo, a doença matou 15. "Há cada vez mais gente morrendo de hemorragia por cirrose, o que indica hepatite avançada", diz Eli Bruno.

Plano Nacional
Os cerca de 210 mil presos do sistema passarão a receber o mesmo tratamento de saúde que os cidadãos em liberdade. O Plano Nacional de Saúde do Sistema Penitenciário, em implantação, prevê unidades básicas de saúde dentro de presídios com mais de cem detentos, além do credenciamento de hospitais.
No encerramento da conferência de redução de danos, os participantes divulgaram uma moção pedindo urgência na implantação do programa, que tem parceria dos ministérios da Justiça e da Saúde e prevê ações de redução de danos e fornecimento de insumos. Em outras palavras, a troca de seringas no interior dos presídios pode estar entre as ações contempladas, o que significa um reconhecimento de que há uso de drogas no interior das prisões. "Todas as ações deverão ser compactuadas no âmbito de cada Estado", diz Maria Cristina Fernandes Ferreira, assessora do Ministério da Saúde. A troca de seringas, mesmo como projeto-piloto na área da saúde, depende do aval da Justiça, do Ministério Público e do diretor do presídio.
Segundo Maria Cristina Ferreira, são os Estados que estão demorando no detalhamento de seus planos, que incluem o cadastramento de equipes e dos hospitais de referência.
A conferência questionou como ficará o tratamento da dependência química dentro dos presídios. O reconhecimento de que o uso de drogas ocorre implica também montar estratégias de tratamento, dizem os especialistas.



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