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São Paulo, domingo, 15 de junho de 2003

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TURISMO

Sem nenhum final de semana prolongado até o Natal, solução é criar atrações diferentes para evitar prejuízo no setor

Empresários buscam alternativa a último feriado do ano

Caio Guatelli/Folha Imagem
A assessora de eventos Fernanda Barbosa, ao lado de seu filho, não gosta da lotação dos lugares nos finais de semana prolongados


MARIO CESAR CARVALHO
DA REPORTAGEM LOCAL

Não bastassem os juros escorchantes, a violência cavalar e o desemprego ciclópico, mais uma nuvem negra turva o horizonte: não haverá nenhum feriado prolongado para os paulistanos até o Natal depois do de Corpus Christi, na próxima quinta-feira.
Como se fosse uma conspiração contra o ócio, três dos feriados do segundo semestre caem em domingos: o de 7 de setembro, o de 12 de outubro e o de 2 de novembro. Como tristeza não tem fim, o 15 de novembro será num sábado.
"É um horror", diz a publicitária Caroline Moraes Souza Ramos, 25, que só deixa de ir para o litoral norte em caso de "dilúvio ou neve", como ela brinca.
"Adoro feriado prolongado porque você cria uma rotina fora de São Paulo. E agora, como é que eu vou fazer?"
Essa mesma pergunta aflige a indústria do turismo. Aí, o horror de que fala Ramos não é uma figura retórica -é fato. Um fim de semana prolongado, com 2 milhões de paulistanos fora da cidade, gera gastos da ordem de R$ 240 milhões, de acordo com uma estimativa feita para a Folha por Wilson Rabahy, 61, professor titular de turismo da Escola de Comunicações e Artes da USP e coordenador dos projetos de turismo da Fipe (Fundação Instituto de Pesquisa Econômica). É essa a perda causada pela inexistência de feriados prolongados.
"Os feriados são um grande atrativo porque quem mais viaja são os estudantes e aqueles que trabalham", diz Rabahy.
Esse tipo de dificuldade sazonal tem seu lado positivo, segundo Virgílio Carvalho, 52, ex-secretário nacional de Turismo e professor da USP: obriga a indústria do turismo a se profissionalizar.
Dez praias do litoral norte paulista se uniram para criar atrações que não se esgotem no binômio praia-verão. É a recém-criada Costa dos Alcatrazes, uma associação que reúne 22 hotéis e 14 restaurantes em um trecho de 25 quilômetros de praias que vai de Boracéia a Boissucanga.
A programação de julho inclui cursos de culinária com chefs como Sérgio Arno e Luciano Bosseggia, aulas de recreação infantil com professores do MAM (Museu de Arte Moderna), shows de jazz, bossa-nova e blues, e exploração das trilhas da serra do Mar.
A razão do projeto é a baixa ocupação dos hotéis e restaurantes fora do verão, uma taxa que varia de 30% a 40% e é sempre pior no segundo semestre, de acordo com Tomas Guidotti, 39, dono do hotel Aldeia de Sahy. A meta do projeto é elevar a ocupação para 50% no próximo ano.
A falta de feriados prolongados no segundo semestre levou a Costa de Alcatrazes a buscar outros alvos. Um deles são os turistas das grandes cidades do interior paulista, como São José dos Campos, Campinas e Sorocaba. Uma das idéias é promover campanhas nos eventuais feriados prolongados desses municípios.
Campos do Jordão, na região montanhosa do Estado, é um exemplo do peso do feriado prolongado. Entre quinta-feira e domingo, devem passar por lá 410 mil pessoas, um contingente maior do que o das duas primeiras semanas de julho, quando são esperados 380 mil turistas.
Fora do inverno, a saída é tentar driblar a ociosidade com convenções. Em maio, por exemplo, o Congresso Paulista de Cardiologia levou 13 mil pessoas à cidade, segundo o empresário e jornalista João Dória Jr., que criou lá o Arts & Convention Center. "Sem feriados prolongados, vamos ter de buscar mais eventos", diz.
O diabo é que a cidade de São Paulo ainda não aprendeu a faturar com quem fica por aqui nos fins de semana, sobretudo os hotéis, na avaliação de Caio Luiz de Carvalho, 51, presidente da Embratur no governo de Fernando Henrique Cardoso e professor da Fundação Getúlio Vargas.
"São Paulo não tem estratégia nem inteligência para aproveitar essa ociosidade de turistas pela cidade. Isso gera desemprego", diz Luiz de Carvalho.
A estratégia mais óbvia, de acordo com Carvalho, é baixar preços: hotéis que cobram diárias de R$ 300 poderiam cobrar R$ 100 no final de semana.
O chef Alex Atala, 35, é uma espécie de personificação de que quase toda notícia ruim tem seu lado bom. Atala diz ter duas adorações fora a cozinha: pescaria e barcos. Como não pode viajar nos fins de semana por causa do restaurante do qual é dono, o DOM, aproveitava os feriados para pescar. "Vendo por esse lado, a falta de feriado é uma chatice", diz.
O lado bom, afirma, é que o seu restaurante fatura mais do que nunca quando não há feriados. Atala acredita existir uma espécie de compensação para quem fica na cidade. "Quando não tem feriado, o cliente pede um prato mais sofisticado, bebe um vinho melhor, pede duas sobremesas em vez de uma. A pessoa se presenteia."
Fernanda Barbosa, 35, ex-modelo e assessora de eventos, também não chia da falta de feriados. "Feriado prolongado é bom, mas também dá agonia porque tudo fica lotado. Às vezes é melhor não ter esse estresse", afirma.
Principalmente se você for como ela, que tem o seu próprio negócio e, quando o cansaço atinge níveis críticos, inventa o seu próprio feriado prolongado.

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