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São Paulo, domingo, 15 de junho de 2003

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EDUCAÇÃO

1.073 docentes podem sair se considerarem a reforma previdenciária prejudicial, diz o reitor Adolpho José Melfi

USP pode ter aposentadoria de 22% dos professores

ARMANDO PEREIRA FILHO
EDITOR-ASSISTENTE DE VEÍCULOS E CONSTRUÇÃO

Nada menos do que 22% dos professores da Universidade de São Paulo estão em condições de se aposentar e podem fazer isso se considerarem que a reforma previdenciária será prejudicial.
Isso seria um "baque grande" para a USP, que completa 70 anos em janeiro de 2004, avalia seu reitor, Adolpho José Melfi.
No entanto, ele tenta demonstrar otimismo e afirma não acreditar que haja aposentadoria em massa. Mas o governo federal tem demonstrado preocupação com o possível êxodo do funcionalismo. Uma das áreas mais fragilizadas seria justamente a academia.
Além da perda de cérebros, a USP também tem outras preocupações. As cotas para entrada de alunos carentes, por exemplo. Melfi diz que é necessário haver políticas públicas para atender a essa demanda, mas afirma que a entrada de alunos por cotas prejudica o nível da universidade.
Leia a seguir trechos de entrevista concedida à Folha.

Folha - Como estão as finanças da USP?
Adolpho José Melfi -
Nosso orçamento é distribuído a partir de uma cota-parte do ICMS [9,57% para as três universidades estaduais -USP, Unicamp e Unesp]. O orçamento pode variar em razão do desenvolvimento da economia. Se observarmos o orçamento dos últimos anos, ele vem tendo uma evolução razoável. Em 1996, era de R$ 769 mi; em 2002, foi de R$ 1,404 bi, o que significa que dobrou. Neste ano, temos uma situação um pouco mais preocupante, porque a economia vem caindo e a inflação subiu.

Folha - A USP arca com os gastos de seus aposentados. Como está a situação?
Melfi -
Os aposentados são um problema que nós vamos ter de resolver. Quando ganhamos autonomia, em 1989, os aposentados representavam 19% da folha de pagamento. Hoje são 29%. Desde 98, são 29% e o número tem se mantido. Agora a curva atingiu um patamar de equilíbrio.

Folha - A reforma previdenciária pode desequilibrar essa situação?
Melfi -
Na mudança anterior da Previdência (1998), houve grande aumento. Agora não. Estamos perfeitamente dentro da média.

É verdade que cerca de mil professores pediram a contagem de tempo para aposentadoria agora?
Melfi -
Dos 4.857 professores da USP, 1.073 têm tempo de aposentadoria. Evidentemente que isso é preocupante, são 22% do nosso corpo docente. Agora, esse tempo de aposentadoria não significa que eles vão se aposentar. Claro que, se houver perigo de acabar com os direitos adquiridos, vamos ter um problema. Mas não é problema só nosso, é de todo o funcionalismo. Seria ruim, um baque grande para a universidade. Agora, não sinto esse movimento pela aposentadoria.

Folha - A USP faz 70 anos em 2004. Onde ela acertou e onde ela errou?
Melfi -
A USP é extremamente complexa, é muito difícil analisar de um ponto de vista monolítico. Mas, se fizermos isso, vamos falar que a USP acertou mais do que errou. A USP forma pouco menos de 40% de todos os doutores formados no país. Trinta por cento de toda a pesquisa científica brasileira é feita na USP. Então, existem indicadores que mostram que a USP acertou.
Um grande problema que vejo nas universidades públicas é o número baixo de vagas para ingresso. Com a universidade pública, de pesquisa e, portanto, cara, dificilmente vamos atender toda a comunidade que chega às portas da universidade. A Fuvest teve, neste ano, 165 mil candidatos, e a USP oferece 8.000 vagas.

Folha - E qual a sua proposta?
Melfi -
Aí devemos ter uma política de Estado, uma política de longo prazo. O que as universidades podem fazer é colaborar na discussão, juntamente com outros organismos do Estado, sobre como poderíamos atender a toda essa população. Através de escolas técnicas, universidades com outras características e bolsas de estudo para estudantes carentes em universidades particulares.

Folha - A entrada de alunos por cotas pode causar algum prejuízo para a qualidade da universidade, por serem estudantes que, em tese, estão menos preparados que os das escolas particulares?
Melfi -
Acho que sim, acho que a cota tem esse problema e acho que a cota também é uma questão discriminatória. Agora, acho que é um problema muito sério, que nós vamos ter de estudar. Já existe uma comissão no âmbito do Cruesp (Conselho de Reitores das Universidades Estaduais de São Paulo) para estudar esse problema da exclusão.
Acho que temos de trabalhar em diferentes frentes. Melhorar o nível da escola pública, dar bolsas para cursinhos [pré-vestibulares] e ter avaliações de quais universidades privadas poderiam ter alunos com bolsa paga pelo governo.

Folha - Os críticos dizem que as fundações são uma forma de privatizar a universidade pública. Qual o papel das fundações na USP?
Melfi -
Vejo as fundações de maneira benéfica para a universidade, por causa da agilidade de estabelecer convênios etc. O que acho que precisa ser melhor definido é de que maneira essa fundação deve se relacionar com a universidade. O que precisamos é ter um controle efetivo dessas fundações.

Folha - O que o sr. chama de controle efetivo? Há algum problema que precise ser corrigido?
Melfi -
Hoje, as fundações provavelmente têm um controle financeiro muito maior. Não há desvio de dinheiro, nada disso. O problema é do relacionamento com a universidade. Determinadas atividades que uma fundação pode fazer, por que isso não é feito pela universidade? Por exemplo, ministrar cursos de extensão.

Folha - A reitoria tem alguma influência nessas fundações.
Melfi -
Não. Elas funcionam todas fora da USP. Talvez algumas dêem cursos dentro da USP. Esses cursos dentro da universidade, as fundações pagam pelo espaço. Mas se elas dão um curso, estão usando o nome da USP, que é uma grife. Então acho que aí temos de ter um controle maior. Para uma atividade, o "overhead" deveria ser de 30%; para outro, de 10%; para outro, não cobrar nada.

Folha - Mas como se regula isso?
Melfi -
O assunto ficou muito polarizado e não existia possibilidade de aprovar qualquer projeto tentando regulamentar o uso. Não existe esse perigo de privatização da universidade pública. Isso é bobagem.

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